O que surgiu primeiro: o ovo ou a galinha?
O que é mais importante: a informação que os media
querem vender ou a informação que o público quer consumir?
Os media procuram vender. Mais unidades e em mais
quantidade que os seus concorrentes. Logo, vão atrás dos “gostos” do público.
O público usa a informação como forma de exorcizar os
seus males, satisfazendo-se com o sucesso dos seus heróis e minimizando os seus
males com a grandeza dos males dos outros.
Mas o público não quer ser informado em profundidade
sobre as vitórias dos heróis. Porque sabe que cada vitória é consequência de
muitas derrotas, e de derrotas está ele cheio no dia-a-dia.
E o público não quer saber das origens e consequências
dos males dos outros, com receio de neles encontrar os seus próprios males,
aqueles que o atrapalham e incomodam, e de poder antever o dia seguinte.
E como ninguém é herói todos os dias, o herói de hoje
é o esquecido de amanhã, que novos heróis serão descobertos pelos media. Que se
não tiverem novos heróis a apresentar, venderão menos e terão menos lucros, que
ter lucro é o seu objectivo.
E como falar dos males em profundidade é remexer em
feridas dolorosas, há que evitar essas dores, que ninguém compra produtos que
provoquem dores agudas e prolongadas, e ter lucro é o seu objectivo.
A missão do comunicador contemporâneo (seja ele de
texto, som, imagem ou ideias) é encontrar todos os dias novos heróis, novos
males, que ajudem na facturação da empresa onde trabalham. Como esta facturação
depende, em boa medida, da facturação da concorrência, há que ir mais longe, há
que ser mais apelativo, há que mostrar ao público que os novos males que se
mostram são mais maus e mais distantes, que os novos heróis que se exibem são
mais dignos e mais credíveis.
Deixou de ser importante fazer, como nos juramentos de
tribunal dos filmes americanos, “a verdade, toda a verdade e nada mais que a
verdade.” Na concorrência dos media, apenas a “a verdade” tem algum peso (e não
muito!). “Toda a verdade” deixou de ser importante, porque incómoda para o
público e cara na produção. Já o “Nada mais que a verdade” depende dos
conceitos éticos de quem produz, nem sempre os mais recomendáveis.
Assim, a relação entre os media e o público tornou-se
(e é!) uma relação simplista em que um vende e o outro compra produtos para
aliviar consciências e incómodos quotidianos. Tal como a botica vende pomadas
para o lumbago e pensos para os calos.
A missão do jornalista ou do técnico de comunicação
deixou de ser (se alguma vez foi) intervencionista na sociedade para ser a de
fabricante de notícias, com a conta certa de dor e prazer no público para o
manter como consumidor fiel.
E o público deixou de querer (se alguma vez quis)
estar alerta sobre o que o cerca, restringindo-se ao seu pequeno mundo
doméstico e familiar. Procura na informação os paliativos para as suas
maleitas, não se preocupando com as suas causas nem com o prevenir de novas.
Alguns há, honra lhes seja feita, que não se encaixam
neste consumismo informativo. Pessoas há que procuram saber mais e mais fundo,
comunicadores há que procuram contar e explicar tudo sobre cada tema e sobre
todos os temas. Mas como estas atitudes são cada vez em menor número, este
circuito produtor/consumidor é cada vez mais marginal, talvez condenado à
extinção.
Está em nós (produtores) e em nós (consumidores), não
permitir que esta estupidificação no conhecimento do mundo que nos rodeia
grasse como uma epidemia fatal!
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