Fotografar um velório? Não me parece ser das coisas mais
comuns ou apetecíveis. Pelo menos por cá, que culturas há que o fazem, com o
maior respeito pelos defuntos e familiares.
Exactamente por isso, no lugar de fotografar a defunta,
preferi fotografar os parentes, que não arredaram pé de junto dela. Umas
mantendo o viço do verde, outras mostrando que o tempo deixa marcas.
Quanto à tombada, trata-se uma conífera, com talvez mais de
cinco metros de tronco despido de galhos e bem mais do dobro com galhada com
folhas permanentes verdes na forma de agulhas. Na ponta das quais se juntam as
águas da chuva sob a forma de gotas que se debatem com o dilema de ali ficarem,
penduradas, ou deixarem-se cair quando engordadas.
Enquanto erecta, marcava presença com a sua magnificência no
meio de um dos terreiros da jardim da estrela. As suas raízes de superfície
foram, ao longo dos anos, deformando o tapete betuminoso e rosado com que
revestiram as zonas pedonais. Forte obstáculo para aprendizes de caminhar ou
utilizadores de bengalas ou muletas, desafio aliciante para os utilizadores de
bicicletas, trotinetas ou skates, que usavam os declives como forma de se afastarem
do chão durante um ou dois segundos, demonstrando assim a sua perícia e gerando
a adrenalina necessária à prática desportiva.
No seu tombar, deixou bem funda a sua raiz vertical própria
da espécie, bem como as de superfície. Partiu-se, muito simplesmente, pertinho
do canteiro de pedra que circundava o tronco. E não sei se provocou vítimas
humanas, mas estou em crer que não, ou o sensacionalismo informativo teria
falado disso. Que uma decana árvore morrer de pé, mesmo que tenha propiciado incontaveis
horas de sombra amena na canícula, não é motivo de relato.
Tal como não é motivo de trabalho de escribas o ter a copa,
ao tombar, destruído parte de um canteiro de rosas da Galileia, oferta da
embaixada Israelita há anos e não sei porque motivo. Mas com direito a placa
alusiva ao facto.
A morte faz parte da vida, humanos ou não, animais ou
vegetais. Os jardineiros municipais terão um pesado trabalho pela frente, ao darem
destino a esta frondosa árvore. Para já, limitaram-se a cercar o seu corpo com
uma fita vermelho e branca, como se ninguém se apercebesse da sua presença e
corresse o risco de nela tropeçar.
Pro mim, que soube do facto pelas redes sociais, fui lá
despedir-me dela, que muito me protegeu enquanto ali fui o fotógrafo
À-Lá-Minuta. E da minha presença no local fica o registo dos parentes que se
aguentam a pé firme. Que não fotografo velórios ou funerais. Muito menos de
amigos.
By me
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