domingo, 26 de dezembro de 2021

Manhã de natal




Este ano acordei tarde na manhã de natal. A noite fora longa e não me apeteceu o sacrifício de uma quase directa para ir ver o acordar da cidade.

Por isso, quando cheguei ao centro ela já estava enérgica. Já se contavam por dezenas os que passeavam, algumas esplanadas já tinham clientes para um pequeno-almoço ao ar livre e os sem abrigo já tinham zarpado para outras paragens, por vontade própria ou por incitamento policial.

Claro que vi aquilo que contava: mais que muitas mãos dadas. Creio que o 25 de dezembro rivaliza com o 14 de fevereiro neste aspecto. A única diferença é que agora não são maioritariamente jovens. São casais de todas as idades, ainda que a maioria acima dos quarenta, que se passeiam por uma cidade quase vazia e de mão dada. E, tónica comum, são forasteiros. Casais que aqui vieram passar a quadra natalícia e que, em acordando e não querendo desperdiçar tempo num quarto de hotel, vieram para a rua. Muitos acompanhados pela prole, infantil ou juvenil.

Com a desertificação do centro da cidade, são cada vez menos os que acorrem ao chamamento das igrejas. Mas os que vão fazem questão de o fazer com roupas de circunstância, mais de circunstância que nos regulares domingos ou dias santos.

Tal como me foi fácil de identificar as habitações onde o natal não é festa maior, se festa de todo. Bastava olhar e ver em que janelas se tentava secar roupa em dia de chuvinha miudinha.

De igual forma, mas mais em ambiente de jardim, assisti a uma tradição de fazer crescer sorrisos em qualquer rosto: a exibição e/ou partilha por parte dos pequenotes das prendas recém recebidas. Bolas, patins, bicicletas... aquilo que não dependa de electricidade nem de wi-fi. A mais estranha, mas estranha mesmo, foi um petiz, com uns sete ou oito anitos, todo satisfeito com uma detector de metais de brincar mas funcional. Pergunto-me que conversas acontecerão naquela família.

Uma tradição muito minha não cumpri: o almoço de natal. Durante anos este aconteceu num restaurante alfacinha, daqueles que nunca fecham nem neste dia. Ainda que nele se tenha que abrir um pouco os cordões à bolsa, a refeição merece e um dia não são dias. Mas não me apeceu ter que mostrar certificados disto e daquilo, que os tempos que correm impõem, para poder comer. Regressei a casa, ao conforto familiar e ao almoço tardio que me esperava.

E sim, no bairro onde moro não há roupa a secar à janela neste dia, mas também não há varandas e varandins com balaustradas em ferro forjado nem fachadas cobertas de azulejos.


By me

Sem comentários: