Este ano acordei tarde na manhã de natal. A noite fora longa
e não me apeteceu o sacrifício de uma quase directa para ir ver o acordar da
cidade.
Por isso, quando cheguei ao centro ela já estava enérgica. Já
se contavam por dezenas os que passeavam, algumas esplanadas já tinham clientes
para um pequeno-almoço ao ar livre e os sem abrigo já tinham zarpado para
outras paragens, por vontade própria ou por incitamento policial.
Claro que vi aquilo que contava: mais que muitas mãos dadas.
Creio que o 25 de dezembro rivaliza com o 14 de fevereiro neste aspecto. A única
diferença é que agora não são maioritariamente jovens. São casais de todas as
idades, ainda que a maioria acima dos quarenta, que se passeiam por uma cidade
quase vazia e de mão dada. E, tónica comum, são forasteiros. Casais que aqui
vieram passar a quadra natalícia e que, em acordando e não querendo desperdiçar
tempo num quarto de hotel, vieram para a rua. Muitos acompanhados pela prole,
infantil ou juvenil.
Com a desertificação do centro da cidade, são cada vez menos
os que acorrem ao chamamento das igrejas. Mas os que vão fazem questão de o
fazer com roupas de circunstância, mais de circunstância que nos regulares
domingos ou dias santos.
Tal como me foi fácil de identificar as habitações onde o
natal não é festa maior, se festa de todo. Bastava olhar e ver em que janelas
se tentava secar roupa em dia de chuvinha miudinha.
De igual forma, mas mais em ambiente de jardim, assisti a
uma tradição de fazer crescer sorrisos em qualquer rosto: a exibição e/ou
partilha por parte dos pequenotes das prendas recém recebidas. Bolas, patins,
bicicletas... aquilo que não dependa de electricidade nem de wi-fi. A mais
estranha, mas estranha mesmo, foi um petiz, com uns sete ou oito anitos, todo
satisfeito com uma detector de metais de brincar mas funcional. Pergunto-me que
conversas acontecerão naquela família.
Uma tradição muito minha não cumpri: o almoço de natal. Durante
anos este aconteceu num restaurante alfacinha, daqueles que nunca fecham nem
neste dia. Ainda que nele se tenha que abrir um pouco os cordões à bolsa, a
refeição merece e um dia não são dias. Mas não me apeceu ter que mostrar certificados
disto e daquilo, que os tempos que correm impõem, para poder comer. Regressei a
casa, ao conforto familiar e ao almoço tardio que me esperava.
E sim, no bairro onde moro não há roupa a secar à janela
neste dia, mas também não há varandas e varandins com balaustradas em ferro
forjado nem fachadas cobertas de azulejos.
By me
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