Por vezes gostava de conseguir seguir a linha desta canção,
da ópera “Porgy and Bess”: “I got plenty o’ nottin”.
O conceito de nada possuir que não os afectos, o universo e
um tapete é algo de belo, quase utópico. Um desapego do material, um despojar
do inútil…
Mas depois…
Depois vêm as vontades de usufruir de todas as outras coisas
que temos por belas, por importantes e que, junto com os afectos, nos
completam.
Uma ocasião, faz já muitos anos, numa ronda por livrarias
tropecei num livro.
Tratava-se de uma colectânea de fotografias pornográficas do
séc. XIX, um conjunto raro de encontrar. Que, se bem que o tema sempre tenha
sido abordado fotograficamente ou com qualquer outra forma de expressão, a
moral pública e a religião sempre fizeram questão de remeter essas
representações para locais recônditos, com raríssimas excepções. E o séc. XIX
não foi excepção. Aquela colectânea, que se bem recordo até estava muito bem
impressa, era um documento na história da fotografia que engrandeceria qualquer
biblioteca temática ou conhecimento.
Infelizmente, naquele momento não tinha eu dinheiro para
ele, que recordo ser bem caro.
Quando por ele voltei, poucos dias depois, já tinha sido
vendido. Para gaudio do comprador e frustração minha.
Sendo certo que não haverá temas tabu para serem
fotografados, ao longo dos anos fui juntando algumas outras obras sobre o
assunto. Algumas no meio de muitas outras que por aqui possuo. E muito menos do
que gostaria, sobre o tema ou qualquer outro.
Que se há coisa que me dá prazer é ver ou rever livros ou
exposições fotográficas, em que os autores deram o melhor de si para exprimirem
sentimentos ou satisfazerem clientes ou público. Mesmo a pornografia, o nu, o
erótico. Ou a guerra, os massacres, os políticos, a fome. Mesmo que se tratem
de temas que não me sejam queridos, que me incomodem até, a fotografia é tão
abrangente quanto a mente humana. E uma das coisas que me atrai na fotografia é
o ela ser o espelho da humanidade. Um dos espelhos da humanidade.
E se aquilo que faço é em parte com esse objectivo, fará
todo o sentido procurar os trabalhos de outros, mesmo que não me agradem, para
deles tirar pistas e criar a minha própria linha de abordagem. Por muito má que
seja, será a minha abordagem e a minha forma de ver e de me expressar.
Sobre o agora badalado e polémico caso da exposição de trabalhos
de Mapplethorpe, o mais provável é não a ir ver.
Pese embora a qualidade das impressões dever ser muito boa,
pese embora o tamanho das impressões estar de acordo com o autor (o tamanho da
imagem final é algo que, as mais das vezes, se esquece e, no entanto, é vital
no processo fotográfico, desde a tomada de vista até à exibição ou venda), pese
embora seja bem diferente o ver fotografias numa parede ou num livro (já nem
falo no ecrã do computador), o autor e o seu trabalho não me atrai o suficiente
para ir passar um dia fora da minha cidade, com pernoita incluída.
Fico-me pelo livro com parte das suas fotografias que aqui
tenho, há anos. A que, talvez uma vez por ano ou nem isso, dou uma olhada. E
que, em sendo a oportunidade certa, uso para neófitos verem, mesmo que em
terapia de choque, para que o seu conhecimento sobre a arte e a técnica
fotográfica seja bem mais abrangente que aquilo que tantos académicos, lentes e
profs permitem que se conheça.
O conhecimento não é, por si só, nem bom nem mau. É apenas
uma ferramenta para os nossos próprios caminhos. E quantas mais ferramentas
tivermos, melhor e mais profícuo será ele.
Sem comentários:
Enviar um comentário