quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Iconógrafo



Em regra, os fotógrafos andam de um lado para o outro, em busca do melhor assunto, da melhor paisagem, para fazerem a sua arte.
Alguns desses trabalhos são de cortar a respiração.
Eu gostava de ser assim: de poder ir para onde me apetecesse, fotografar aquilo que quero, sabendo que irei encontrar a luz boa de que gosto sobre assuntos que me cativam.
Mas não posso. Por este ou por aquele motivo não posso. Tempo para as deslocações, forma de me deslocar, custos… não posso.
Vai daí, aos poucos, encontrei uma outra forma de fazer fotografia. Não será espectacular, não será de cortar a respiração com as luzes, cores, paisagens ou modelos… mas asseguro que correspondem ao meu estado de alma no momento em que a faço e no momento em que a trato.
Por vezes estou num qualquer lugar, banalíssimo, como uma paragem de autocarro, ou a tomar café ou mesmo num momento de higiene interior. E, de súbito, tenho aquela vontade de ilustrar aquele assunto que me assalta a alma. É um impulso tão intenso quanto a vontade de fumar um cigarro. Ou mesmo bem mais animal: como o de tossir. E até parece que rebento se o não fizer.
E é neste momento que tenho o meu prazer imagético: onde estou, ou num raio diminuto de 30 ou mesmo 100 metros, encontrar algo que corresponda ao que penso ou sinto. E a forma de o fazer.
Muito frequentemente isso é feito com uma câmara de bolso. Que me acompanha para onde quer que vá, sempre pronta a ser usada, pese embora as limitações técnicas que tem. Outras vezes, e tendo comigo a DSLR com todas as suas potencialidades, de uma forma mais elaborada, sendo mais fácil brincar com a luz, quer criando ou recriando ambientes, que usando-a para realçar este ou aquele aspecto.
Depois, há o jogo da perspectiva: de que forma, em função de uma dado pensamento, e dependendo do assunto e das potencialidades técnicas do momento, consigo eu fazer o registo que quero? E quantas vezes, não o sendo possível na altura do disparo, faço-o na mesma sabendo que terei – e como – que o alterar depois para obter o que quero.
E esse depois também é divertido.
Em estando eu tranquilo, sem pressas ou pressões, acontece umas horas mais tarde, em frente do computador que tenho em casa. Dois bons ecrãs (por vezes três) rapidez no processamento, luz ambiente controlada em termos de intensidade, incidência nos ecrãs e cor, o conforto da minha cadeira… tudo como eu o quero.
Outras, a pressa em acabar o que me vai na alma não se conforma com essa espera. E recorro ao meu portátil. Ecrã pequeno, com uma superfície que reflecte com facilidade a luz ambiente, adulterando contrastes e cores. Sentado num jardim, no treme-treme do comboio, acabado de entrar num café, entre dois momentos de trabalho… é onde me apetece e como o consigo fazer.
Não são obras-primas, nem sequer merecem ser expostas numa parede. Por vezes nem mesmo numa rede digital.
Mas uma coisa eu garanto: de um modo ou de outro, divirto-me encontrando soluções fotográficas onde quer que seja, com o que quer que seja.
Mesmo não indo longe, em busca das paisagens, modelos e luzes de cortar a respiração.

Talvez que eu não seja um fotógrafo, mas antes um iconógrafo. Que o que produzo são ícones do que me vai na alma.

By me 

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