terça-feira, 12 de novembro de 2013

Romantismos



Volta e meia oiço ou leio sobre alguém que quer fotografar em grande formato.
E, confesso, fico irmanado nesse desejo.
Não creio é que seja irmão nos motivos, isso não acredito.
Que aqueles que o querem fazer, as mais das vezes não o fizeram nunca. E não sabem quanto pesa uma câmara, digamos, 9x12. Ou quanto pesa ou que espaço ocupa para transporte uma objectiva dita normal ou uma dita “tele”. Tal como, talvez, não saibam quanto pesa um tripé para o suportar. Ou que volume ocupa um parasol ajustável para uma câmara dessas. Ou o que é transportar, digamos, três chassis duplos, para seis fotografias, e junto uma caixa com película rígida virgem, outra para guardar as expostas (caso se use o processo de revelar de acordo com o contraste pretendido, várias caixas de película exposta), mais a câmara escura portátil para carregar e descarregar os chassis, mais a lupa de focagem…
Acredito igualmente que nunca tiveram a dificuldade de focar uma imagem invertida com uma lupa, bem escondidos debaixo de um pano preto (que também há que transportar). Tal como acredito que não sabem, e ao invés do que é hábito nos tempos que correm, o foco faz-se no montante traseiro e não no frontal, para não alterar a perspectiva. E a grande maioria dos que querem fotografar em grande formato não sabe que as objectivas não são particularmente luminosas, o que não ajuda de todo na focagem no despolido.
Também não saberão eles o prazer que dá olhar para um negativo, maior ainda se se tratar de um diapositivo, 9x12 e ver tudo, mas tudo mesmo, com uma lupa numa mesa de luz. Nada que se compare a um 35mm ou mesmo a um digital de 40Mp num bom monitor.
Trabalhar com grande formato dá muito gozo no resultado final mas dá tanto trabalho e tanta incerteza, que obriga a mais que redobrados cuidados, que só se pode dar graças ao advento de boas películas pequenas (primeiro) e bons digitais (depois).
A disciplina que o grande formato exige (bem como o custo, volume, peso) é algo único. Que pode ser adquirido com qualquer outra, mas que implica que a disciplina e método sejam já algo inerente ao fotógrafo.

Aquilo que muitos dos que querem fotografar com grande formato (9x12, 13x18 ou mesmo 18x24) é o romantismo de outras épocas, em que ser-se fotógrafo era ser-se alguém, em que o acto de fotografar estava envolvido em mistério e magia que o digital e a banalização da fotografia vieram fazer desaparecer.
Por mim, tenho saudades desses tempos. Do rigor e satisfação no manuseio do equipamento, na qualidade do obtido, nos efeitos que os descentramentos e basculamentos permitem, no usar de uma peça que, de tão simples que é se torna complicada de nos devolver o que dela esperamos.
Apesar de tudo isto, gostaria de relembrar a quem esqueceu que a qualidade da fotografia não se aquilata pela complexidade ou preço do equipamento mas antes por aquilo que sabemos fazer com ele. Uma “boa” fotografia faz-se com quase qualquer tipo de câmara, saibam-se as suas potencialidades e limitações.

Na imagem, eu mesmo há uma trintena de anos, usando uma Linhoff Tecnika 70, fotografando em película rígida 6,5x9. Na mala, que estaria por perto, o chassis de película 120, que me permitia o 6x7 e um outro que me permitia o 6x9. E mais duas objectivas com as respectivas pranchetas.
Em casa, à época, havia uma outra Linhoff, uma Kardan Color 9x12.
Tanto uma como outra me vieram parar às mãos por necessidade para as fotografias de publicidade que então fazia. E a voragem do tempo e as necessidades do mesmo fizeram com que delas me desfizesse.
Fazia eu, então, melhores fotogafias com elas que as que faço hoje com uma Pentax K7 ou uma Pentax LX ou uma Nikon Coolpix 7000? Não creio.
Fazia fotografia com disciplina, isso sim. Fez-me aprender muito sobre ver antes de premir o obturador, garantidamente. Fez-me descobrir e aprender muito sobre luz, claro. Fez-me ver muitas fotografias de bons autores e ler muitos livros e ver tantas exposições quanto pude, em ordem a aprender com os mestres.
Mas, e acima de tudo, fez-me ter a certeza que Fotografia é tudo aquilo de moroso, chato, penoso, difícil, doloroso por vezes, partos difíceis mesmo, que medeia entre aquilo que vemos e aquilo que mostramos aos outros.
Houvesse forma de registar aquilo que o meu olhar capta sem equipamento…


By me

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