Não eram particularmente bonitas. Pelo menos pelos nossos padrões Lusos. Mas também não eram feias. Nem pelos nossos padrões nem, suponho, pelos delas.
Irmanadas nos seus metro e sessenta, mais ou menos, diferiam nos volumes, sendo que uma era bem seca de carnes, enquanto que a outra era rechonchuda, sem ser gorda no entanto.
Partilhavam também as roupas modestas, os cabelos longos em trança numa e apanhados na outra, a carteira dependurada a tira-colo e os pensos-rápidos, os Borda d’Água e os calendários, que iam vendendo a quem encontravam no seu périplo pela cidade.
Ninguém duvidaria que se tratavam de duas Romani, ciganas vindas da Roménia.
Uma delas já eu tinha visto por ali, com a curiosidade dos seus vinte anitos e de quem vagueia sem rumo certo. Já tinha parado para ver o que ali acontecia, mas a sua timidez, bem manifesta no seu sorriso nervoso, sempre a arredara da frente da objectiva.
A outra, a mais gordita, ainda não a havia visto. Comunicativa e com um sorriso franco e cativante, logo identificou a sua conterrânea que tenho no expositor. E ainda que tenha tentado convencer a amiga em a acompanhar na experiência fotográfica, acabou por a fazer sozinha. Os pensos e o Borda d’Água ficaram de fora, mas o calendário fez questão de exibir para a posteridade. Talvez por ter a imagem da Senhora de Fátima com os pastorinhos.
Conversa feita, fotografia entregue, risos tidos, pedido de uma segunda, como não poderia deixar de ser, partiram para outras paragens por ali, em busca de alguém que quisesse o seu negócio.
O que me deixou mesmo espantado foi o fecho do episódio.
Antes de se afastar, a retratada quis-me cumprimentar e esticou-me a mão para um quase viril aperto de mão. Que retribui sem mais. E a amiga, que já tinha dado uns passos, voltou atrás para cumprir este ritual que em nada consta das tradições de origem. Que ao que sei, que fui saber para confirmar, por lá e nesta comunidade, contactos físicos entre Romani e não Romani são raros em havendo diferença de género. Mais ainda, se um homem da família não estiver presente.
O que me deixou mesmo boquiaberto foi o seu remate de saudação: levantado a mão, levou-me àquela palmada amigável de palma com palma. Sinal de código de grupo juvenil, em nada relacionado com as suas origens e menos ainda com as nossas diferenças de idade.
Foi toque de cumplicidade, um agradecimento personalizado de alguém que pouco ou nada tem para dar em troca do recebido. E foi também um misturar de culturas, um mostrar conhecer os hábitos locais, ainda que não os certos.
Esta aculturação, e facto de o ter feito, fez com esta fotografia feita no Jardim da Estrela fosse das mais bem pagas que ali tive.
Senti-me honrado com a deferência!
Texto e imagem: by me
Irmanadas nos seus metro e sessenta, mais ou menos, diferiam nos volumes, sendo que uma era bem seca de carnes, enquanto que a outra era rechonchuda, sem ser gorda no entanto.
Partilhavam também as roupas modestas, os cabelos longos em trança numa e apanhados na outra, a carteira dependurada a tira-colo e os pensos-rápidos, os Borda d’Água e os calendários, que iam vendendo a quem encontravam no seu périplo pela cidade.
Ninguém duvidaria que se tratavam de duas Romani, ciganas vindas da Roménia.
Uma delas já eu tinha visto por ali, com a curiosidade dos seus vinte anitos e de quem vagueia sem rumo certo. Já tinha parado para ver o que ali acontecia, mas a sua timidez, bem manifesta no seu sorriso nervoso, sempre a arredara da frente da objectiva.
A outra, a mais gordita, ainda não a havia visto. Comunicativa e com um sorriso franco e cativante, logo identificou a sua conterrânea que tenho no expositor. E ainda que tenha tentado convencer a amiga em a acompanhar na experiência fotográfica, acabou por a fazer sozinha. Os pensos e o Borda d’Água ficaram de fora, mas o calendário fez questão de exibir para a posteridade. Talvez por ter a imagem da Senhora de Fátima com os pastorinhos.
Conversa feita, fotografia entregue, risos tidos, pedido de uma segunda, como não poderia deixar de ser, partiram para outras paragens por ali, em busca de alguém que quisesse o seu negócio.
O que me deixou mesmo espantado foi o fecho do episódio.
Antes de se afastar, a retratada quis-me cumprimentar e esticou-me a mão para um quase viril aperto de mão. Que retribui sem mais. E a amiga, que já tinha dado uns passos, voltou atrás para cumprir este ritual que em nada consta das tradições de origem. Que ao que sei, que fui saber para confirmar, por lá e nesta comunidade, contactos físicos entre Romani e não Romani são raros em havendo diferença de género. Mais ainda, se um homem da família não estiver presente.
O que me deixou mesmo boquiaberto foi o seu remate de saudação: levantado a mão, levou-me àquela palmada amigável de palma com palma. Sinal de código de grupo juvenil, em nada relacionado com as suas origens e menos ainda com as nossas diferenças de idade.
Foi toque de cumplicidade, um agradecimento personalizado de alguém que pouco ou nada tem para dar em troca do recebido. E foi também um misturar de culturas, um mostrar conhecer os hábitos locais, ainda que não os certos.
Esta aculturação, e facto de o ter feito, fez com esta fotografia feita no Jardim da Estrela fosse das mais bem pagas que ali tive.
Senti-me honrado com a deferência!
Texto e imagem: by me
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