Conheço este cão há, pelo menos, uma semana. Mas duvido que ele me conheça.
É que, em verdade, é difícil conhecer ou reconhecer alguém que mais não é que um espectador anónimo da nossa condição de prisioneiro.
Pelo menos desde que o vi pela primeira vez, ele vagueia pela linha de caminho-de-ferro que serve o meu bairro. Não sei como ele lá foi parar, suspeito que por um qualquer buraco ocasional na vedação. Que toda a linha, no seus quase 30 Km, está vedada, ou bem que com redes, ou bem que com grades, ou ainda com o cimento das plataformas de embarque.
Sei que, a uns 7 ou 8 Km de onde moro, a linha está em obras, pelo que acredito que seja fácil de aí encontrar uma saída. Mas, para tal, há que o saber e ter a determinação de até lá ir. O que não será o caso deste cão.
Vagueia para cima e para baixo na linha, em busca de uma saída e, principalmente, de comida. Que não é habitual encontrar nestes corredores férreos.
Do cimo dos cais, onde esperamos o comboio, os passageiros condoem-se do canito, procurando afasta-lo do trajecto das composições. Mas nenhum de nós salta aquele metro e pouco, atravessa sobre as chulipas e vai agarra-lo para dali o retirar. Para já, porque não creio que se deixasse agarrar assim, sem mais nem menos, por um desconhecido. Depois, porque a nossa pressa em chegar onde quer que seja nos impede de tal acção.
E ele vai definhando, que de cada vez que o vejo está mais magro. Aprendeu, a duras penas, que a forma mais fácil de por ali caminhar é pondo as patas nos blocos de cimentos, que as pedras são aguçadas e magoam. O instinto e o medo fazem-no, sem grande dificuldade, afastar-se do monstro barulhento que por ele passa a cada 15 minutos, horário diurno, para cada lado. E continua a sua caminhada sem fim à vista, cada vez mais vagaroso.
Está este cão num a prisão. Tem trinta quilómetros, é enorme, mas dela não pode ou sabe sair e a ela está condenado por toda a sua vida, que será breve.
Tal como nós estamos condenados a viver na cidade, no país, no planeta em que vivemos. Porque o tamanho da prisão não conta, desde que dela não possamos ou saibamos sair!
Texto e imagem: by me
É que, em verdade, é difícil conhecer ou reconhecer alguém que mais não é que um espectador anónimo da nossa condição de prisioneiro.
Pelo menos desde que o vi pela primeira vez, ele vagueia pela linha de caminho-de-ferro que serve o meu bairro. Não sei como ele lá foi parar, suspeito que por um qualquer buraco ocasional na vedação. Que toda a linha, no seus quase 30 Km, está vedada, ou bem que com redes, ou bem que com grades, ou ainda com o cimento das plataformas de embarque.
Sei que, a uns 7 ou 8 Km de onde moro, a linha está em obras, pelo que acredito que seja fácil de aí encontrar uma saída. Mas, para tal, há que o saber e ter a determinação de até lá ir. O que não será o caso deste cão.
Vagueia para cima e para baixo na linha, em busca de uma saída e, principalmente, de comida. Que não é habitual encontrar nestes corredores férreos.
Do cimo dos cais, onde esperamos o comboio, os passageiros condoem-se do canito, procurando afasta-lo do trajecto das composições. Mas nenhum de nós salta aquele metro e pouco, atravessa sobre as chulipas e vai agarra-lo para dali o retirar. Para já, porque não creio que se deixasse agarrar assim, sem mais nem menos, por um desconhecido. Depois, porque a nossa pressa em chegar onde quer que seja nos impede de tal acção.
E ele vai definhando, que de cada vez que o vejo está mais magro. Aprendeu, a duras penas, que a forma mais fácil de por ali caminhar é pondo as patas nos blocos de cimentos, que as pedras são aguçadas e magoam. O instinto e o medo fazem-no, sem grande dificuldade, afastar-se do monstro barulhento que por ele passa a cada 15 minutos, horário diurno, para cada lado. E continua a sua caminhada sem fim à vista, cada vez mais vagaroso.
Está este cão num a prisão. Tem trinta quilómetros, é enorme, mas dela não pode ou sabe sair e a ela está condenado por toda a sua vida, que será breve.
Tal como nós estamos condenados a viver na cidade, no país, no planeta em que vivemos. Porque o tamanho da prisão não conta, desde que dela não possamos ou saibamos sair!
Texto e imagem: by me
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