segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Sobre um livro



Um destes dias, em tendo acabado de ler o livro que tinha entre mãos para as idas e regressos do trabalho, coloquei-o na estante e tentei escolher um outro. De entre os lidos e os não lidos.
Não me apeteceu grandes leituras, pelo que optei, como dizem os mais pequenotes, por um com bonecos: uma colectânea de fotografias.
As colectâneas de fotografias, sejam organizadas por autores, geografia, temas abordados ou história, têm sempre a desvantagem de serem o resultado da opinião de quem as faz.
Não sendo possível incluir todos os trabalhos relativos ao assunto ou tema, pelas razões lógicas de espaço, a escolha recairá sempre sobre o que o autor da obra entende por ser representativo. E do seu gosto, também.
Mas também têm a vantagem de permitir a quem as vê aceder a trabalhos que, de outra forma, seriam confusos e difíceis de conhecer. Pela raridade e pela dispersão das obras exibidas ou referências.
Por outro lado, quando falamos ou pensamos em fotografia e na sua história e evolução, pensamos quase sempre em termos de Europa e América do Norte, com fugazes passagens pela Rússia e extremo Oriente. Como se o resto do mundo não tivesse fotógrafos, alguns de grande qualidade.
E não é fácil aceder a estes trabalhos, que livros sobre fotografia e sobre os autores das zonas menos divulgadas são raros.
Por tudo isto, quando há uns anos encontrei uma colectânea de fotógrafos da América Latina, organizada sob o ponto de vista de países e autores, entendi ser um achado e comprei-o.
Foi essa colectânea que saiu de casa comigo nesse dia.
Já no trabalho, encontrei uma colega que se interessa, e para além das obrigações profissionais, sobre as diversas vertentes das artes visuais, fotografia incluída. E tratei de lhe mostrar o livro.
No fim de contas e tal como a fotografia, um livro que não seja visto de pouco servirá.
Pois ela “deu-lhe uma voltinha”, vendo as fotografias e lendo, na diagonal, os pequenos textos em jeito de legenda, que as acompanham.
Passada quase uma hora, que o trabalho nesse dia isso permitia, devolveu-mo com um comentário breve:
“Não gosto!”
Se sequer parar para considerar os contextos históricos, culturais e económicos dos autores ou países representados.

Ora batatas!
Se nós só nos relacionarmos e conhecermos aquilo de que gostamos, ignorando o que não gostamos, estamos a fechar os olhos e a alma a uma grande parte do mundo criativo, impedindo a nossa própria evolução. E isto é tanto mais verdade quanto que recusamos conhecer seja trabalho pessoal e criativo.
Nesta obra em particular há fotografias de que não gosto. Pouco me dizem, tanto do ponto de vista material como humano ou estético. Mas todas elas – estas e todas as outras que não conheço – me mostram um mundo menos conhecido visto pelos olhos de quem o viveu e não dos “curiosos” com as suas reportagens. É uma visão de um continente visto de dentro, com todas as afectividades e perspectivas que isso implica. Conhecer isso é alargar os nossos próprios horizontes, é ir mais longe no que sabemos de nós mesmos e ser capaz de perceber que os nossos estereotipos e preconceitos afinal não são tão sólidos e definitivos. É ganhar pistas para o nosso próprio trabalho e evolução.

No caso desta minha colega, não creio que adiante muito voltar a mostrar-lhe livros. Com ou sem bonecos.

A imagem exibida é de Enrique Bostelman (1939-2003, México), incluída na colectânea referida.



By me

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