segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Portas e narizes


Estas são as portas de um centro comercial, em Lisboa.
Este, em particular, possui muitas iguais a estas, nos quatro acessos que tem para o exterior.
Em qualquer dos casos, são semelhantes a todas as outras que podemos encontrar em tantos e tantos centros comerciais por esse país fora. Tal como são semelhantes às portas de inúmeras lojas ou equivalentes, em tudo quanto é sítio:
Dois batentes, por vezes um só, abrindo tanto para um lado como para o outro e possuindo mola de retorno, obrigando-as a manterem-se fechadas.
Por vezes essa mola é suficientemente forte para nos obrigar a fazer uma boa dose de força para as abrir, mas estou em crer que o objectivo é mesmo mantê-las fechadas, impedindo as correntes de ar e mantendo o ar condicionado do interior tão estável e controlável quanto o possível.
Pois se há coisa que me deixe em estado de quase histeria é querer entrar num destes espaços e, a pessoa que à minha frente caminha, abrir a porta para passar e larga-la, ignorando por completo quem a segue. E eu, se for à distância aziaga, levar com a dita porta no nariz, caso vá menos atento.
E tanto me incomoda a situação (a porta no nariz e o acto em si), que entendia haver uma enorme maioria de gente a assim se comportar. Já que a quantidade de vezes que tal me aconteceu quase iguala a quantidade de gente constante numa qualquer lista telefónica.
A ponto de, ao aproximar-me de uma destas portas, fazer apostas comigo mesmo (e perder, as mais das vezes) se quem me antecede a largará, ignorando a minha existência e presença à sua retaguarda, ou se fará o que eu mesmo faço por regra, quase sem excepção: segurar a porta em passando-a, olhar para trás e, caso alguém se aproxime, dar-lhe a passagem em segurança.
Acontece-me mesmo que, se o movimento é grande no local, acabar por ficar a segurar a porta a quase uma dúzia de passantes, que a maioria nem se dá ao trabalho de repetir o gesto que vê e lhe convém.

Pois hoje, em tendo tempo, estando no local e com paciência, decidi observar o comportamento generalizado. Quem passa, alheando-se dos demais e quem, ainda que de relance, se assegure que a porta não agredirá um qualquer nariz incauto.
Fiquei surpreendido. Os números que se seguem são fruto de mera observação não anotada e têm o rigor que meia hora de ali parado pode ter.
Cerca de um terço de quem cruza uma porta destas presta atenção a quem o segue, evitando que ela – a porta – seja agressora de narizes.
Em termos divisão por género está ela por ela: tanto homens quanto mulheres têm esse cuidado por igual.
Mas se dividirmos os adultos de cada um dos géneros em três grupos (dos vintes até aos trinta e tal, destes até aos até aos quarentas e muitos e daí em diante) os resultados já não são homogéneos.
O grupo de mulheres que cuida de quem a segue é o do meio, entre os trintas e os quarentas e muitos. Já os homens são bem mais cuidadosos a partir dos quarentas e tais, pouca ou nenhuma atenção prestando daí para baixo.
Já os que estão abaixo dos vintes, têm comportamentos uniformes: não prestam a menor atenção a quem os segue a entrar ou sair.
Um factor que influencia o comportamento é a ocupação que as mãos têm. Se ambas tiverem objectos mais pesados ou volumosos que um livro, jornal ou carteira, é certo e sabido que não se interessam sobre quem os segue. O mesmo sucede com quem, mesmo tendo uma mão livre, tenha a outra ocupada com um telemóvel, quer seja em conversação ou envio e/ou leitura de mensagens. Tal como se constata o mesmo com aqueles que vão ao exterior apenas para fumar um cigarrito e retornam de seguida. A porta empurra-se e quem vier atrás que se cuide.
Curiosamente, estas preocupações e atenções para com partilha espaço e passagem são transversais ao nível económico que aparentam, já que, com melhores ou piores roupas, com ar de quem possui muito ou nada tem, a mediania de acções mantém-se de acordo com o factor idade.
Detalhe com graça: este centro comercial, enquanto ali estive a observar, foi alvo de visitas, a entrar ou sair, de gente com aspecto de turista ou estrangeiro. E, do que constatei, a esmagadora maioria teve o cuidado de verificar se alguém o seguia e de segurar a porta. Independentemente da idade.

Acredito que um sociólogo pudesse, desta observação, retirar algumas elações. Ou, para o fazer, querer amostragens bem mais alargadas, como as horas do dia, a estação do ano ou o ponto do país.
Mas, para mim, serviu-me para várias conclusões.
Por um lado, são bem menos os egoístas do que eu pensava, ainda que bem mais do que gostaria.
Por outro, acredito que nem me apercebo de quando alguém me segura a porta, apenas ficando possesso quando tal não acontece.
Um pouco mais de atenção da minha parte é recomendável. Bem como um pouco menos de preconceito para com os meus concidadãos.
Claro que irei manter o irónico e bem lançado “Obrigado!” com que brindo os que me agridem, que muitas vezes estranham e não entendem o que se passa.
Tal como o sorriso e agradecimento a quem fizer a gentileza de evitar que eu leve com a porta no nariz.



Texto e imagem: by me

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