Landru, o famoso criminoso francês do inicio do séc. XX, era um homem pequenino, careca, longa barba, sobrancelhas muito grossas e uma assinalável falta de elegância corporal, ainda que cavalheiro no trato. Ficou conhecido por barba azul, o que diz muito sobre a sua aparência. Apesar disso, conseguiu envolver-se romanticamente com mais de trezentas damas, tendo extorquido dinheiro contado. Heranças e variados bens à maioria delas. No delicado exercício, acabou também por matar dez mulheres, um rapazinho e dois cães, entrando para a lista do mais famosos assassinos em série da história. Em consequência, o Estado cortou-lhe a cabeça em 1922.
Landru constitui um paradigma de pobres coitados, indivíduos de fraca moral e muita capacidade de iniciativa, que se empenham, quase sempre na solidão, a cumprir aquilo que todos os governos praticam desde os imemoriais tempos. Ou seja, matar gente. Apesar do esforço, os mais bem sucedidos como o colombiano Pedro Lopez, conhecido pelo monstro dos andes, fulminou cerca de trezentas pessoas, enquanto o famoso canibal Andrei Chikatilo andou pelas cinquenta. Ora basta pensar que uma única bomba em Hiroshima deu cabo de 130.000 almas de uma só vez. Em Nagazaki foram 70.000.
A contabilidade da mortandade no séc. XX é aliás bastante elucidativa. Entre guerras, genocídios, tiranias, fome e doenças causadas directamente pelos conflitos bélicos fala-se em 200 milhões. Assassínios em série tanto perpetrados por loucos ditadores, como por serenos democratas. Tanto por desvairados déspotas, como por cumpridores funcionários públicos. Praticamente ninguém escapa. Basta recordar a freira belga implicada no extermínio de Tutsis no genocídio do Ruanda, que regou mulheres e crianças com gasolina antes de lhes pegar fogo.
Mesmo pequenos e aparentemente pacíficos países como o nosso não deixaram de dar o seu contributo. Nas guerras coloniais contamos com mais de 60.000 mortos em Moçambique e entre 75.000 e 120.000 para Angola, sendo que destes números cerca de 5% são portugueses, 15% são guerrilheiros e 80% civis, o que é bastante significativo. A frugalidade da nossa tropa, pois a guerra civil angolana que se seguiu eliminou quase um milhão em menos tempo, não deveria contudo satisfazer ninguém.
Chegados aqui, qualquer pessoa de bom senso, e já agora também com um pouco de humanidade, esperaria que o séc. XXi nos trouxesse uma alteração radical neste estado de coisas. Ao contrário do que por aí se diz, está demonstrado que o recurso à guerra nunca é a derradeira solução, mas o primeiro dos problemas. Não só porque se perdem vidas e energias que deveriam ser consumidas noutras actividades mais produtivas e benéficas, mas acima de tudo porque o argumento bélico representa sempre uma regressão civilizacional. Num momento em que se pensava que iríamos ao repúdio pela violência guerreira e se tenta construir um tribunal internacional para julgar os verdadeiros e directos pelos massacres e genocídios, eis que a linguagem bélica ressurge em força na sua medonha trivialidade. Não só pela boca de loucos, tiranos e ditadores, mas também por alguns democratas eleitos pelo povo e responsáveis perante constituições e parlamentos. O mais chocante da situação actual é pois confirmar que os assassinos em série não andam só a monte, imersos nas suas paranóias perversas, mas estão também à frente de muitos dos nossos governos democráticos.
Texto: by Leonel Moura, Março 2003
Imagem: by me
Landru constitui um paradigma de pobres coitados, indivíduos de fraca moral e muita capacidade de iniciativa, que se empenham, quase sempre na solidão, a cumprir aquilo que todos os governos praticam desde os imemoriais tempos. Ou seja, matar gente. Apesar do esforço, os mais bem sucedidos como o colombiano Pedro Lopez, conhecido pelo monstro dos andes, fulminou cerca de trezentas pessoas, enquanto o famoso canibal Andrei Chikatilo andou pelas cinquenta. Ora basta pensar que uma única bomba em Hiroshima deu cabo de 130.000 almas de uma só vez. Em Nagazaki foram 70.000.
A contabilidade da mortandade no séc. XX é aliás bastante elucidativa. Entre guerras, genocídios, tiranias, fome e doenças causadas directamente pelos conflitos bélicos fala-se em 200 milhões. Assassínios em série tanto perpetrados por loucos ditadores, como por serenos democratas. Tanto por desvairados déspotas, como por cumpridores funcionários públicos. Praticamente ninguém escapa. Basta recordar a freira belga implicada no extermínio de Tutsis no genocídio do Ruanda, que regou mulheres e crianças com gasolina antes de lhes pegar fogo.
Mesmo pequenos e aparentemente pacíficos países como o nosso não deixaram de dar o seu contributo. Nas guerras coloniais contamos com mais de 60.000 mortos em Moçambique e entre 75.000 e 120.000 para Angola, sendo que destes números cerca de 5% são portugueses, 15% são guerrilheiros e 80% civis, o que é bastante significativo. A frugalidade da nossa tropa, pois a guerra civil angolana que se seguiu eliminou quase um milhão em menos tempo, não deveria contudo satisfazer ninguém.
Chegados aqui, qualquer pessoa de bom senso, e já agora também com um pouco de humanidade, esperaria que o séc. XXi nos trouxesse uma alteração radical neste estado de coisas. Ao contrário do que por aí se diz, está demonstrado que o recurso à guerra nunca é a derradeira solução, mas o primeiro dos problemas. Não só porque se perdem vidas e energias que deveriam ser consumidas noutras actividades mais produtivas e benéficas, mas acima de tudo porque o argumento bélico representa sempre uma regressão civilizacional. Num momento em que se pensava que iríamos ao repúdio pela violência guerreira e se tenta construir um tribunal internacional para julgar os verdadeiros e directos pelos massacres e genocídios, eis que a linguagem bélica ressurge em força na sua medonha trivialidade. Não só pela boca de loucos, tiranos e ditadores, mas também por alguns democratas eleitos pelo povo e responsáveis perante constituições e parlamentos. O mais chocante da situação actual é pois confirmar que os assassinos em série não andam só a monte, imersos nas suas paranóias perversas, mas estão também à frente de muitos dos nossos governos democráticos.
Texto: by Leonel Moura, Março 2003
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