Quando cheguei ao
balcão da livraria, o empregado conversava com um casal.
Era ela, de uns 25
de idade e menos uns cinco que o companheiro, que fazia as despesas da
conversa:
“Eu disse-lhe que
queria a primeira edição, e esta é a segunda!”, ao mesmo tempo que ia passando
as páginas do livro ainda virgem.
“Sim, mas repare:
a primeira esgotou e esta saiu uns seis meses depois. Além do mais não é a
primeira edição do autor, já que é traduzida…”
“Pois! Mas as
primeiras edições é que têm valor. Eu só compro primeiras edições!”
“Bem, pois desse
livro não temos.”
Entretanto eu, que
tenho um nariz maior que a minha barriga, decidi meter-me na conversa, que não
era minha mas que me fazia comichão atrás da orelha:
“Desculpe, mas o
que é importante é a edição ou a obra escrita? Tanto mais que são ambas deste
ano, ou do ano passado.”
“O que importa, o
que dá valor a uma obra e a uma biblioteca é serem primeiras edições. Por vezes
até têm erros ou gralhas, que são corrigidos nas edições subsequentes. E é isso
que lhes dá valor.”
“Olhe, não sabia”,
disse eu disposto a ir muito mais longe com aquela emproada. “E, sabe, se me
arranjar a primeira edição deste livro que procuro, ou souber onde a encontrar,
fico-lhe muito agradecido.”
“E que livro é?”
“Antígona, de Sófocles.”
“Não, acho nunca
ou vi falar. O senhor não tem?”,perguntou, virando-se para o empregado.
Antes que ele
pudesse reagir, atalhei:
“Bem, talvez seja
natural, já que foi escrito há coisa de dois mil e quinhentos anos, na Grécia
antiga.”
Corou até à raiz
do cabelo, que não sei se pintado, deu meia volta com a sua segunda edição na mão
e seguiu a trote para a caixa, seguida de perto pelo companheiro, que sorria
discretamente.
Após uns segundos
de silencio cúmplice, disse para o empregado, que entretanto tentava encontrar
na lista do computar se o livro que eu queria existia ou não na livraria:
“É pena! Talvez um
dia ela descubra que o valor de uma biblioteca não está na raridade das edições
mas na raridade das obras. E, já agora, no que o conjunto dos seus livros, e
cada um em particular, nos pode contar e enriquecer.”
O empregado sorriu
e afastou-se, para regressar pouco depois com o que eu pedira. Este, por cinco
euros.
By me
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