domingo, 5 de abril de 2009

Paradinho da Silva


A estória que a seguir conto foi por mim protagonizada faz já uns bons anos. Só por si ela, a estória, nunca deveria ter acontecido, já que os comportamentos descritos – o meu e o do automobilista envolvido – não serão dos mais edificantes.
Mas aconteceu e tudo acabou em bem, sendo hoje motivo de risota ou, pelo menos, de sorrisos.
O que eu não sabia, na altura, é que já alguém tinha tido o mesmo problema cívico e tinha tido uma abordagem equivalente à minha. Bem mais elaborada, por sinal. Visivel AQUI - CLICK.
E a conclusão que daqui se pode tirar, para além dos conteúdos óbvios dos relatos, é que o ser humano, perante os mesmos problemas, acaba por encontrar soluções equivalentes, seja qual for o ponto do planeta em que se esteja.

Em tempos dei aulas numa escola profissional localizada no centro de Lisboa. Ficava ela numa curva de uma rua por onde passavam – e passam – os eléctricos da Carris.
Pois havia aquele cidadão, que nunca cheguei a conhecer, que costumava estacionar o carro, como muitos outros, em cima do passeio. O que não seria grave, visto este ser bem largo e permitir a passagem de peões, não fosse o facto de ser na curva. E, devido aos eléctricos, ele tinha que chegar o carro bem à frente, mesmo até tocar na parede, ou o amarelo não passaria.
Um dia, talvez devido a uma noite menos bem dormida ou a pressa de conseguir ainda um cafezinho antes da primeira aula, dei de novo com o tal carro. E entendi que não deveria por a minha vida em risco por causa da sua atitude egoísta. Vai daí, pus um pé em cima da roda e, usando-a como degrau, icei-me e passei-lhe por cima do capot. Não andei aos saltos em cima dele, mas também não tive qualquer tipo de cuidado com a forma de caminhar.
Claro está que alguns alunos bem como o funcionário da porta me viram e não faltaram alguns comentários jocosos.
No dia seguinte o carro lá estava de novo. Aliás, o local era tão reservado ao seu dono que já havia marcas do pára-choques no estuque da parede do prédio. E, tal como o carro, havia também um número anormal de alunos, dentro e fora do portão, à espera de verem o que se passaria. E, como o que mais custa é sempre a primeira vez, passei-lhe por cima de novo.
Ao terceiro dia a coisa repetiu-se, apenas com uma diferença: tinha boa parte da população estudantil à minha espera e, incluso, alguns professores que, discretamente, espreitavam por algumas janelas. E passei-lhe por cima mais uma vez, por entre a gritaria de aplauso da malta nova e uns sorrisos dos colegas.
Nunca aconteceu a quarta vez. O carro nunca mais ali estacionou e não mais alguém da escola teve que vir para o asfalto, calçada para ser exacto, por via daquela figura. Mas também nunca ninguém me veio pedir contas sobre os danos no capot do carro, que as chapas hoje pouco mais são que papel. E, no entanto, o meu acto e a minha figura em nada primaram pela discrição. Terá sido, certamente, a vergonha e o receio de ser confrontado com o que costumava fazer que o ou a terá impedido de me procurar.
Tudo isto antes da introdução dos parquímetros e dos amaldiçoados (por alguns) fiscais da EMEL. É que, as mais das vezes, só à bruta ou com medo algumas pessoas aprendem a respeitar os seus concidadãos.


Texto e fotografia: by me

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