sábado, 11 de março de 2023

Um livro




Termos que nos deslocar a pé na cidade tem destas coisas: ser surpreendido com mercados de rua onde podemos encontrar pequenos tesoiros. Foi o caso.

Este livro, usado, custou-me cinco euros. Quase o preços da chuva, convenhamos. Mas o seu valor é muito superior, se considerarmos outros factores que não os de capa.

Para além de fazer parte de uma série de livros que existe desde há 40 anos, ao que sei, que são razoavelmente bem impressos para o preço, no seu conjunto abordam todas as vertentes da fotografia. Monografias por autor ou temáticas.

Claro está que um livro temático depende, no seu conteúdo, das opções do editor. Que pode não deixar de ser tendencioso e terá, certamente, preferências. Este exemplar é um exemplo oposto num aspecto.

Ao contrário da esmagadora maioria das obras sobre o nu fotográfico, este não se atém ao nu feminino. Contendo fotografias desde 1855 até 1984, talvez que 20% delas são masculinas, o que é particularmente raro.

Começa, desde logo, por geralmente se fazerem muito menos fotografias de nu de homens que de mulheres. Suponho que haverá algum receio por parte dos homens fotógrafos de serem chamados de “bichas” se o fizerem.

Depois porque, e isto aplica-se na pintura também, a maioria dos consumidores de fotografia (em livro, em revistas ou individuais) serem homens. Quer os que compram avulso, quer os que encomendam aos autores para comprar. E, não nos enganemos, a grande maioria dos consumidores de fotografia, bem assim como os produtores, fazem-no como substituto daquilo que não podem possuir. Seja um pôr-do-sol, seja um castelo, seja um automóvel, seja um ser humano. Um acto de cobiça, se quiserem ir longe nos conceitos. Sendo a maioria dos consumidores e produtores de fotografia homens, faz algum sentido que cobicem mulheres. Na posse ou na produção de fotografias, as mais das vezes, o sentido estético pesa objectivamente. Mas a posse do fotografado pesa subjectivamente, sem que disso nos apercebamos.

Como se tudo isso não bastasse, existe um conceito bacoco em que o belo no corpo humano apenas acontece no feminino. Só as mulheres são belas, só os corpos das mulheres podem acordar a líbido, só os corpos das mulheres podem evocar sentimentos. Conceito bacoco e machista! Sugiro que perguntem às mulheres se assim acontece.

É assim, pelo acima dito sumariamente e por tudo o que não é dito que longo seria, que um livro que aborde a fotografia do nu e inclua fotografias de nus masculinos se torna numa peça rara de encontrar. Numa livraria, numa feira de rua ou numa biblioteca. Excepção feita à minha, onde constam alguns.

Acrescento que imagem da capa que mostro está assumidamente censurada por mim para evitar que os puritanos (humanos ou algoritmos) das redes sociais a bloqueiem tão rápido a encontrem ou seja denunciada.


By me

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