Ray Bradbury, “Fahrenheit 451”, 1953
“- Porque não estás na escola? Vejo-te todos os dias a
vaguear por aí.
- Oh, não sentem a minha falta. – disse ela – Sou anti-social,
dizem. Não me misturo. É tão estranho. Sou bastante sociável. Tudo depende
daquilo que se entender por sociável, não é? Sociável para mim significa
conversar consigo sobre coisas como estas. – Fez chocalhar umas castanhas que
tinham caído da árvore no pátio da frente. – Ou dizer que o mundo é tão
estranho. Estar com as pessoas é agradável. Mas não me parece social juntar um
grupo de pessoas e depois não as deixar falar, não lhe parece? Uma hora de aula
com a TV, uma hora de basquetebol ou basebol ou corrida, mais uma hora de História
da Transcrição ou pintura, e mais desportos, mas sabe, nunca fazemos perguntas,
pelo menos a maioria não faz; apenas nos fazem perguntas, bing, bing, bing, e
nós lá sentados mais quatro horas a ver o professor no filme. Para mim não tem
nada de social. É uma série de tubos e muita água a esguichar, e dizem-nos que
é vinho quando não é. Ao fim do dia estamos tão desfeitos que não conseguimos
fazer mais nada a não ser ir para a cama ou para um parque de diversões para
arreliar pessoas, partir vidraças no Quebra-Janelas, ou destruir carros no
Destruidor de Carros com uma enorme bola de aço. Ou sair de carro e fazer
corridas nas ruas, tentando aproximarmo-nos o mais possível dos candeeiros e
pregar sustos e arrancar os tampões das rodas. Creio que sou aquilo que dizem
que sou. Não tenho amigos. Isso prova que sou anormal. Mas toda a gente que
conheço ou grita ou andas às voltas como louca ou a espancar-se. Reparou como
as pessoas fazem mal umas às outras nos nossos dias?”
Não é muito diferente dos dias de hoje, pois não?
Imagem: by me
Sem comentários:
Enviar um comentário