Não creio que os medievos
pintores soubessem alguma coisa sobre semelhança de triângulos. As proporções
do que fizeram são em função da importância do representado e não de umas
quaisquer leis de geometria.
E, no entanto, o que
deles conhecemos é belo!
Suspeito que os Rapanui,
quando fizeram as mais que conhecidas esculturas da Ilha de Páscoa, nem
desconfiassem da existência de um tal de “número de ouro”.
E como são belas as
esculturas!
Acredito que os Aruaque
que vivem nas florestas amazónicas não saibam identificar frequências luminosas
e as suas harmónicas, ao escolherem estas e não aquelas cores para se decorarem
em momentos de festa ou de luto.
E são belas aquelas
cores!
Nada nos leva a crer que
os antigos japoneses, ao pintarem as paisagens que sobraram até hoje, se
preocupassem com rigores numéricos ou geometrias euclidianas.
Mas são belas as suas
pinturas.
Mas mesmo que larguemos o
passado e as culturas baseadas na antiguidade clássica, veremos, por exemplo,
que a fotografia chinesa pré-ocidentalização, feita por chineses e para consumo
nacional, ignora o que seja a regra dos terços.
E que belas são!
Tal como a iconografia
ortodoxa não sabe o sejam perspectivas lineares.
E como são belos os seus
ícones religiosos!
A propaganda desenhada,
fotográfica, cinematográfica, da era soviética também não era profícua no
recurso aos conceitos clássicos de estética e perspectiva.
Mas são belos os seus
trabalhos!
E se olharmos para o
cinema produzido, por exemplo, por Yimou Zhang com o seu filme “Herói” ou por Edward
Yang, com o seu filme “Yi-Yi”, mesmo que o que nos mostram seja o resultado de
uma perspectiva linear resultante de uma objectiva, não depende facilmente de
regras de equilíbrio ou harmonia ou proporções definíveis por fórmulas
matemáticas.
E como são belos os seus
filmes!
A beleza, ou a estética,
depende antes de mais da cultura de quem produz e de quem aprecia. Os números,
regras, fórmulas, podem justificar algumas coisas, mas não tudo. E,
principalmente, não estão na raiz da criatividade.
Somos o que somos porque
temos um passado que alicerça o presente e projecta o futuro.
A antiguidade, o
renascimento e a revolução industrial vieram mudar muito no que à criação e
expressão pessoal concerne. E ainda bem, que muito de belo foi feito com base
nesses pensamentos.
Mas quando, hoje, tudo
queremos reduzir a fórmulas, regras, cânones, academismos, estamos a padronizar
o ser humano, querendo impor normas à criatividade e, com isso, destruir o que
de mais belo o ser humano tem: fazer diferente e ter prazer nisso!
Nota extra provocatória: tentem lá colocar on-line uma imagem
triangular.
By me
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