terça-feira, 1 de abril de 2025

Velharia discreta


 


Aqueles que vão vendo o que por aqui vou publicando talvez já tenham constado que raramente exibo imagens de pessoas. Homens  ou mulheres, novos ou velhos, com mais ou menos roupas. E constataram bem.

Há vários motivos para isso.

Desde logo o respeito pela imagem de quem é fotografado. E muito se pode dizer sobre isto, trate-se ou não de modelos profissionais, tenham ou não autorizado o fazer da fotografia ou o seu uso posterior. Mas não vou enveredar por aqui agora.

Em seguida um outro aspecto, desde sempre contestado: o fotógrafo é um cobiçador. Não podendo possuir o pôr do sol, o objecto ou o sorriso, fica-se pela sua imagem, um ícone substituto do objecto cobiçado. E eu não almejo possuir alguém, corpo ou alma.

Por fim, e igualmente importante, o ser raro a imagem fotografada agradar ao fotografado em pleno. Quer se trate da forma, da pose ou o que se interpreta do registado. Na melhor das hipóteses, em não se tratando de um modelo profissional, sorriem agradecendo, sempre com alguma mágoa por este ou aquele aspecto estar evidente.

Ou, se preferirem, porque entendem que o implícito ou a leitura possível da imagem não corresponde ao que entendem de si ou querem mostrar aos outros. Quer se trate o ego elevado ou modéstia encapotada.

Este canudo é um exemplo.

Trata-se de uma impressão em preto e branco, com uns quarenta anos de existência e não muito bem conservada como se vê.

A pessoa aqui representada sempre contestou que se tratasse de um retrato mas tão só uma fotografia interpretativa. A minha visão dessa pessoa.

O que acaba por ter graça é que, com o passar dos anos, cada vez mais encontro semelhanças entre o original e o aqui iconificado. Tanto no então como no agora. Parecenças físicas e parecenças de personalidade e comportamentos. Ficarei sempre sem saber se antevi o futuro ou se a pessoa se foi moldando à imagem feita.

Com essa contestação permanente, fiz e tenho feito questão de não exibir a fotografia. Nem on-line, nem em exposições físicas, nem mesmo emoldurada e pendurada em minha casa. No fim de contas, há que respeitar a opinião de quem se disponibilizou ao fazer da fotografia. Mas sempre mantive o positivo guardado. Mal guardado, como se vê, acabando por ficar um rolo de papel que mantém na discrição do seu interior a prata que retrata. Física e psicológicamente, achei eu então e acho eu hoje. Cada vez mais.

Talvez um dia mergulhe fundo nas caixas de antanho, encontre o negativo original e faça uma digitalização. E talvez, só talvez, a exiba perante olhares estranhos ao fotógrafo e a quem foi fotografado.

Mas o original – este – irá manter-se assim: enrolado e discreto.

 

Pentax K1 mkII, Tamron SP Adaptall2 90mm 1:2,5


 By me

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