sábado, 15 de maio de 2021

O telemóvel




Este foi o primeiro telemóvel que possuí que permitia fazer fotografias.

A sua compra aconteceu por dois motivos:

- Por um lado porque o anterior tinha já a bateria a “entregar a alma ao criador”. Apesar da a tratar tão bem e tão de acordo com o fabricante quanto pude, a verdade é que baterias e eternidade não pertencem ao mesmo glossário. Haveria que substituir apenas a bateria ou optar por outro. Acabei por optar por outro e pelo segundo motivo.

- Apetecia-me saber e entender o conceito e a prática de fotografar com tal tipo de dispositivo. O tipo de abordagem mental, a oportunidade, a total portatibilidade, o resultado técnico e as opções estéticas. E se a fotografia é algo que me interessa, haveria que experimentar.

Depois de ter analisado na web os modelos disponíveis, nas suas características técnicas e preços, acabei por querer ouvir as opiniões de vendedores que, mesmo que não usassem semelhante coisa, sempre teriam alguns comentários de clientes e poderiam ajudar-me.

Fiz então uma brincadeira: Entrando nas lojinhas de telemóveis, perguntava a quem estava atrás do balcão: “Procuro uma câmara fotográfica que também faça chamadas telefónicas. O que me aconselha?” Em regra, ficavam a olhar para mim como se me tivesse nascido um apêndice na testa.

Acontece que eu não estava errado. Era mesmo isso que eu procurava e explicava-o a quem estava a vender: eu queria fotografar e, acessoriamente, telefonar.

Acabei por me decidir por este, então já não o último grito da tecnologia mas que satisfazia os meus requisitos: qualidade de imagem, descrição no uso, durabilidade da bateria, volume, capacidade de armazenamento.

Tenho-o guardado, tal como os acessórios e periféricos respectivos. Acabou por ser substituído por um smartphone quando a bateria começou a dar sinais de moribunda. Sem nunca ter avariado ou deixado de fazer o que dele eu queria.

O que acaba por ter graça no meio de tudo isto é que a minha pergunta nas lojas, estranha então, estava apenas adiantada tecnologicamente.

Hoje, os smartphones e demais aparelhos equivalentes são publicitados e vendidos pelas suas capacidades de fotografar e, muito raramente, pela sua capacidade de fazer comunicações de voz. Indo mais longe, lojas há que dividem o seu espaço nos expositores entre câmaras fotográficas e smartphones, como se fossem equivalentes.

Não são!

Pese embora ambos possam fazer fotografias, todo o processo mental para as fazer é, regra geral, bem diferente. Nem melhor nem pior, apenas bem diferente.

A disciplina e o “trabalho” ao usar uma câmara (DSLR, mirrorless ou compacta e de bolso) é muito maior que com um gadget destes, levando a que o resultado seja mais pensado. Não forçosamente melhor, mas mais pensado.

A isto, junte-se a importância atribuída às fotografias feitas com um e com outro suporte.

Com uma câmara, o simples facto de a transportarmos, de a retirarmos do saco, tirarmos a tampa, ajustarmos os parâmetros, etc., faz com que seja algo que só fazemos quando achamos que o registo é algo de medianamente importante. Ou bem mais que isso.

Já uma câmara num telemóvel, porque sempre acessível, porque pouco ou nada exigente de calibrar ou afinar, porque leve e quase esquecida no bolso ou bolsa, é usada a torto e a direito, em selfies, refeições, situações menos próprias ou indiscretas de terceiros ou naquelas sempre iguais fotografias de grupo nos passeios e momentos gastronómicos, sempre numa perspectiva subida e à distância de um braço do primeiro fotografado ou, se for um aficionado, usando um “pau de selfie”. Imagens rápidas, para consumo rápido e olvido rápido. E, muito frequentemente, rapidamente apagadas dos arquivos, assim que são divulgadas numa qualquer rede social.

Não significa isto que fotografar com um aparelho multi-usos seja um erro. Nem pouco mais ou menos! Usar um smartphone, uma câmara DSLR, estonopeica, grande formato, chapa de vidro ou que quer que seja, está sempre certo. Desde que saibamos disso tirar partido, conhecendo-lhes as capacidades e as limitações, bem como o uso possível do resultado. E a satisfação que nos transmite o uso e o resultado.

Ou que saibamos ou queiramos transpor de um sistema para o outro as técnicas e processos mentais possíveis.

Por mim, admito-o, o smartphone faz parte integrante dos objectos que transporto sempre comigo, tal como carteira de documentos, caneta ou cigarros e isqueiro. E uso-o para fotografar nas duas vertentes: bloco de apontamentos do quotidiano (ou registo rápido de algo para não esquecer) ou como câmara fotográfica, no conceito geral do termo, para fazer fotografias que tenho por mais cuidadas ou pensadas.

Os resultados? Bem, dependem muito mais do olho e do cérebro que actua que da ferramenta que se usa.


By me

Sem comentários: