Depois de ler um pequeno ensaio sobre o conceito de férias (em casa, na terra, em terras distantes, o descanso e o aburguesamento do descanso) fiquei com uma dúvida terrível:
Pode um fotógrafo, ou qualquer outra pessoa que tenha uma actividade criativa, estar de férias? Realmente de férias?
Um engenheiro, um amanuense, um talhante, um advogado, um mecânico, podem, em estando de férias, deixar para trás toda a sua actividade profissional, guardando numa gaveta da mente os problemas. E, estando de férias, não ser estimulado pelo que vê ou ouve para algo com isso relacionado.
Não creio que seja possível a um escritor ignorar os comportamentos humanos, guardando pequenos retalhos para os seus romances. Ou um compositor não pode não ouvir as melodias ou ritmos do marulhar das ondas ou do chilrear dos pássaros. Mesmo em tratando-se de uma tempestade ou do feio grasnar de uma gaivota.
Por seu lado o fotógrafo, e aqui falo com conhecimento de causa, mesmo que não tenha a câmara consigo, mesmo que não esteja a olhar para fotografias on-line, impressas no prelo ou expostas numa parede, não consegue deixar de apreciar uma perspectiva, um jogo de luz, um contraste de cores ou um momento único da fauna ou flora, humanos incluídos.
Quantos de nós, que fazemos da fotografia o alimento do estômago ou da alma, não comentámos ou pensámos “Que pena não ter aqui uma câmara”? Ou, mais utopicamente, quantos de nós não desejámos já que os nossos olhos fossem câmaras?
Não creio que um fotógrafo possa em algum momento estar realmente de férias.
O mais que pode acontecer, e uma vez mais falo com conhecimento de causa, é dizermos que estamos no defeso. Ou seja, que não materializamos o que vemos ou imaginamos que vemos, mas tão só estamos a guardar pistas ou quejando para trabalhos futuros.
Um fotógrafo que o seja realmente, artista ou artífice, nunca poderá fazer um real manguito ao que faz e ao que o cerca.
By me
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