quinta-feira, 21 de novembro de 2019
Luz
A propósito do Instagram e outros programas e sites onde as fotografias são publicadas depois de serem objecto de modificação com filtros, recorda-me uma estória televisiva.
O programa “João Baião”, nas noites de sábado da SIC, tinha uma linguagem de imagem inovadora em Portugal: quase não havia planos ou imagens paradas e o conceito de câmara estável parecia não existir. Na altura, alguém classificou esta linguagem de “televisão em movimento”. E fez escola, passados que são todos estes anos.
Aquilo que pouco foi divulgado é que esse tipo de imagem não surgiu como conceito estético mas como solução encontrada “em cima do joelho”. Aquelas horas todas de emissão, com todo aquele espaço e o tentar dar dinamismo visual limitava em muito o uso de tripés ou pedestais para as câmaras. E as câmaras portáteis da época, pesadas que eram, tornavam impossível o seu uso medianamente estável ao ombro ou à mão durante tanto tempo.
Assim, a opção foi tornar uma limitação em estilo e assumir, logo de início do programa, a instabilidade da imagem, forçando mesmo o seu abanar e movimentos rápidos e pouco “certeiros”.
Foi esta abordagem particularmente criticada na altura, até porque o próprio público se cansava da falta de estabilidade. E foi imitada em diversas circunstâncias, com ou sem sucesso.
Passados todos estes anos, esta abordagem visual é um estilo, intitulado “câmara à mão” nos meios académicos. Assume-se a ausência de estabilidade.
Mas é usada de forma parcimoniosa, como código de comunicação ou estilo visual, empregue se e quando se justifica.
Os filtros que modificam ou “estragam” as fotografias são idênticos. São usados para, com um carimbo de “arte”, disfarçar as incapacidades técnicas ou criativas dos seus autores. Desfocada, mal enquadrada, deficientemente exposta, tremida… uns filtros de riscos, cores, redutores de definição ou excesso de saturação e transforma-se aquilo que não se sabe fazer numa “obra de arte”.
Toda a experiência e inovação é necessária e bem-vinda! E a necessidade é a mãe da invenção.
Mas transformar uma poia de vaca em bosta de arte bovina…
Sugiro, para aquele que alinham nestas modas estéticas, que vão aprender os percursos daqueles que de facto inovaram na criatividade. Descobrirão que se trataram de inovações pensadas, argumentadas, decisões conscientes no romper com o classicismo e o convencional. E não por modismos tecnológicos, sugeridos por quem quer vender equipamento ou software. E também não para disfarçar o não saber o que é luz e perspectiva.
By me
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