Foi há pouco mais de uma semana.
Estava eu no trabalho, sentado numa mesa de volta de
questões burocráticas no computador de serviço. Pousada a meu lado, a minha
câmara.
Passa por mim um profissional da imagem que mira e remira a
câmara e, no final, observa:
“Ah, uma Pentax! E faz 4K ou é só Full HD?”
Respondi-lhe que Full HD, mas que não tinha a certeza.
“Pois!”, retorqui-me. “Então está bem. Mas 4K é que é bom!”
Enquanto se afastava sem mais, fiquei a olhá-lo com cara de
palerma, sem bem saber o que lhe dizer. Mas ainda consegui um:
“Sabes, comprei uma câmara fotográfica, não uma de vídeo.”
Passados uns segundos, já com ele fora de vista, é que me
ocorreu uma resposta condigna:
“Bem, com uma 4K ou uma SD, tu não sabes fazer imagem
equilibrada com as dos teus companheiros. Tal como não sabes captar um assunto
em que respeites o espaço que ele necessita, visual ou auditivamente. De igual
forma, o teu trabalho de equipa com os teus colegas é abaixo de sofrível. E
achas que é a qualidade técnica da ferramenta que te vai melhorar o desempenho?”
Mas não pronunciei as palavras. Estas e outras que quase me gritaram
na cabeça. Não só não adiantaria porque não me entenderia como iria criar um
conflito inútil.
Este é o problema que grassa nos dias que correm!
A competição desenfreada a todos os níveis (individual,
colectiva, indústrial, comercial...) faz com que o conteúdo seja negligenciado
em favor da forma. A embalagem tem mais valor que o produto. A resolução é mais
importante que a história. A semiotica mais não é que uma palavra complicada de
significado obscuro.
Tenho estado a fazer uma tarefa ingrata: preparar uma casa
para ser vendida. Ainda tem o recheio e sobre ele ainda não há decisões. Nela abundam
livros, muitos livros, sobre as diversas facetas do audiovisual e da estética. E
da psicologia. E da pintura. E do cinema. E da fotografia. E da arquitectura. E
da comunicação oral, corporal, visual. Toda uma biblioteca que uma grande
quantidade de gente que trabalha no ramo deveria conhecer. Pelo menos em parte.
Pensei, muito seriamente, em fazer chegar parte dela a uma
ou outra escola, para proveito dos alunos. Actuais ou vindoiros. Desisti ainda
antes de divulgar a ideia.
Que o saber, hoje, ou está na net ou não interessa. E se demorar
mais de três ou cinco minutos a ser visto é chato, enfadonho, inútil. Só os cotas
por isso se interessam.
A minha câmara fotográfica irá fazer fotografias. Muitas
fotografias, se eu for capaz disso. Talvez faça alguns vídeos, só por
brincadeira.
Mas, mais que resoluções ou HD’s, interessa-me o que coloco
dentro do rectângulo, com que significado e para contar o quê.
Que a imagem, estática ou animada, serve para contar coisas.
Reais ou ficcionadas. Aos outros ou ao seu autor. O resto são minudências.
E, como diz o povo na sua sabedoria, “Quem não sabe dançar diz
que o chão está torto.”
By me
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