Eram velhinhos, bem velhinhos. Percebi-o pelo pouco que pude
ver dos seus rostos acima das máscaras que usavam.
Estávamos no metro e eu vinha sentado e entretido com o telemóvel.
Dei pela chegada dele porque me passou rente às pernas para se sentar à minha
frente, cruzado. Não prestei atenção a mais nada que não ao recolher as minhas
pernas para que passasse.
Mas levantei os olhos quando senti que outra pessoa se iria
sentar a seu lado e mesmo à minha frente, ignorando as distâncias de segurança.
O meu olhar, quando lá cheguei com ele, era de poucos amigos.
Caramba! A composição ia suficientemente vazia para que pudessem sentar-se
algures que não “tão em cima” de outros passageiros.
Mas fiquei um nico a olhar para eles.
As rugas que lhes via, entre a máscara e o cabelo, bem que
mostravam idade e percursos duros na vida. Não falavam entre si, mas a
cumplicidade com que, sentados, partilhavam o toque entre os braços evidenciava
que nem disso necessitavam. Ele, com as mãos apoiadas no castão da bengala, ela
segurando firmemente a carteira preta e brilhante sobre as pernas, junto com
uns óculos e o passe. Os olhares fixos algures em pontos diferentes da
carruagem não se cruzaram, mas creio que não precisavam: cada um via um pedaço
da vida e, talvez, mais tarde, o comentassem. As roupas eram modestas mas muito
bem cuidadas.
Deste conjunto conjecturei que iriam ou viriam de ou para um
momento ou evento especial.
Em condições normais ter-lhes-ia indicado, por voz ou por
gestos, que ocupassem outros lugares e respeitassem a segurança que os tempos
que correm exigem. Não o fiz!
Olhando pela janela, percebi que faltavam umas três paragens
para a minha e que seria bem mais fácil terminar eu o trajecto de pé, junto à
porta. Protegendo-me e protegendo-os.
Nem sempre podemos exigir o cumprimento de regras aos
outros. Haverá sempre que ponderar circunstâncias, custos e benefícios para as
partes e agir em conformidade.
Aquele casal, aparentando um muito longo percurso em comum,
merecia um tratamento de excepção.
Como calculam, esta não é uma fotografia feita na ocasião,
apesar de muito me ter apetecido fazê-la.
By me
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