quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

O poder da fotografia




Publiquei esta fotografia, sem as letras, há uns tempos (anos).
Mostra ela alguns dos “Comunards” da Comuna de Paris, em 1871 que, tendo sido capturados pelas forças do poder e a partir de fotografias feitas nas barricadas, foram fuzilados.
A imagem, feita por Disdéri, é forte!
Mas também a actual censura do Facebook, que agora ma censurou e excluiu da minha página.
O que é mais curioso é que foi objecto de censura não por mostrar mortos nos respectivos caixões nem por terem sido presos e executados a partir de fotografias.
O motivo dos censores é a imagem mostrar a genitália dos defuntos, que eles mal estão cobertos pela mortalha.

O poder da fotografia é enorme e implacável.



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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Cala-te



Confesso que estranho que as notícias, tão céleres a contar desgraças, estejam a ser tão parcas quanto aos casos de doentes confirmados com o tal de corona em Espanha.
A menos que existam "ordens" específicas sobre a matéria, com o fito de evitar pânicos ou sobressaltos na economia.

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terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Batata frita photográphica



Por mim, podem chamar-lhe batata frita, rabicha do arado ou australopitecus. Que o que é importante é que nos entendamos e o resto é conversa fiada. No entanto…

No entanto custa-me ouvir e ler a palavra “lente” referindo-se a “objectiva”.
Que lentes tenho eu nos meus óculos, uma de cada lado. Por acaso até tenho lentes nos olhos, que são de geometria variável e dão-lhe o nome de cristalino. Tal como a minha lupa é uma lente.
Mas ela só é uma lente até ao ponto em que a coloco num tubo e ponho tudo à frente de um sensor de imagem, eléctrico ou físico.
A partir daí passa a chamar-se objectiva, com ou sem posição variável para efeitos de foco, com ou sem luminosidade controlada para efeitos de exposição.
Mas um sistema óptico, colocado num sistema de registo de luz, cuja função seja alterar a trajectória dos raios luminosos, para criar uma imagem real e invertida, composta que seja por um ou vários elementos, com posicionamentos relativos fixos ou variáveis só é, na minha língua, uma objectiva. É isso que ela é!
Agora se lhe chamam “corrente d’ar”, “campainha de porta” ou acelerador de partículas”, basta que todos o saibam para que todos se entendam.
Resta esclarecer que se lhe chamarem “acelerador de partículas” deverão dizer, como complemento, “de sinal negativo”. É que a luz refracta-se e é desviada na sua trajectória porque diminui de velocidade ao passar de um meio menos denso para outro mais denso. E o inverso também é verdade.
E sendo que estas alterações de velocidade não são iguais para todos os comprimentos de onda (cores) as lentes (porque são compostas de um só elemento e sem tratamento de superfície) têm “aberrações cromáticas”. Por seu turno, as objectivas, porque possuem elementos de densidades variadas, curvaturas diferentes e tratamentos de superfície específicos, têm essas aberrações reduzidas ao mínimo, de acordo com a qualidade dos materiais e que se reflectem no respectivo preço final.

Quem se daria ao trabalho de fotografar usando apenas uma lente e sabendo que a qualidade resultante é bem inferior à de uma objectiva? Eu faço-o, mas a título de experiência e com os resultados controlados.

Mas eu não sou referência, já que photographo com objectivas e com lentes, mas conhecendo-lhes as diferenças. E nunca tentei com batata frita, mas há sempre uma primeira vez para tudo.

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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Seconic



A história é velha de trinta e tal anos.
Comprei este fotómetro a um amigo e mestre, já usado e em excelentes condições de funcionamento.
Usava-o ele, essencialmente, para fazer medições de luz incidente e tinha-lhe sido fornecido uma ainda melhor. Vantagem minha.
Acontece que, já em casa, constato disparidades entre a sua leitura de luz reflectida e os resultados apresentados pela minha câmara. Estranhei e tratei de comparar as medições com outros aparelhos. Sempre a mesma diferença: um stop mais fechado em leitura reflectida. Em leitura incidente estava correctíssimo.
Não havia net como hoje nem os respectivos fóruns. E o manual de instruções, sempre vital, não me fornecia nenhuma indicação, numa primeira abordagem.
Mas a leitura atenta e interpretativa deu-me a resposta: tratando-se de um “fotómetro de estúdio” estava preparado para fazer medições directamente a partir do tom de pele e não de um cinzento com 18% de reflectância como eu queria e todos os outros aparelhos faziam. É interessante este método, supostamente dá resultados mais rápidos, mas é muito ambíguo, já que os tons de pele variam enormemente de individuo para individuo. Aliás, de zona do corpo para zona do corpo.
Resolvi a questão recorrendo ao espírito inventivo e de “desenrasca” que tão bem nos caracteriza:
Na grelha usada para medição reflectida, que aqui se vê entre os meus dedos, tapei alguns dos orifícios com fita preta. Tentativa e erro até os resultados serem os que queria. Bingo!
Até hoje mantem-se fiel e constante nas suas medições, nunca me deixando ficar mal naquilo em que o usei.
O que acaba por ter piada é que há uns anos comprei um outro fotómetro. No caso específico, um exposímetro, já que não indica quantidades de luz mas tão só a exposição a fazer com ela. Luz continua e flash, luz incidente e spotmeter. Tudo em um.
A verdade é que, em modo spot constatei a mesma variação de um stop quando comparado com outros aparelhos que possuo. A marca é a mesma, “Seconic”, e a minha memória acordou. O manual de instruções está na net e forneceu-me a confirmação do que suspeitava: feito para medir a luz na pele do modelo.
Sendo um aparelho digital (L-558), a sua re-calibração foi bem mais fácil e rigorosa, permitindo-me manter os métodos e resultados consistentes do que vou fazendo.

Saber interpretar aquilo que usamos ou fazemos e ajustá-lo à prática é vital em tudo o que fazemos: fotografia ou vida.
A grande vantagem da fotografia é que vem com manual de instruções.

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domingo, 23 de fevereiro de 2020

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Urgências




Um dos argumentos que tenho ouvido de várias bocas contra a recém-votada e futura lei da despenalização da morte medicamente assistida é o haver coisas muito mais importantes a debater e resolver.
Falam-me da corrupção, da fome, da pedofilia… E que há muito mais gente a necessitar de medidas urgentes e profundas que pessoas em sofrimento e a querem morrer sem o conseguirem fazer autonomamente.
Acrescentam alguns que este será um “não assunto” e que a sua mediatização será uma forma de encher a comunicação com um tema pouco relevante para encobrir outros mais importantes e urgentes.
A estes que assim argumentam apenas respondo com uma pergunta: “E se fossem vocês à espera do fim do sofrimento não quereriam que fosse possível com urgência?”



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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Cidadania



Diz-se por sistema neste país que “Eles” têm que fazer algo! As instituições, o governo, os sindicatos, a policia, os tribunais, os patrões, a sociedade civil... 
No entanto tudo isso somos todos nós. Está no nosso direito esperar que o resultado dos nossos impostos sirva para resolver todo o tipo de situações. Mas quem toma as decisões são cidadãos vulgares, com o mesmo tipo de vivência como quaisquer outros. São elementos do chamado “povo português”, votam e pagam impostos como quaisquer outros (espero eu). E se alguns dos portugueses fazem pasteis de nata ou vendem artigos de vestuário, outros trabalham em instituições. As tais dos “Eles”.
A solidariedade, bem como a intervenção cívica, são deveres de todos os cidadãos, seja qual for a sua ocupação. Ao ver alguém com fome ou ao assistir a uma violação, não posso esperar que “Eles”, os das instituições, estejam em horário de funcionamento para o solucionar.
Somos nós, cidadãos, que devemos intervir a cada momento no decorrer da vida, no que ela tem de bom e de mau. Devemos esperar que as instituições funcionem, devemos esforçarmo-nos para que o façam cada vez melhor, mas não devemos esperar que elas actuem como uma intervenção divina. Nós somos as instituições! Eles somos nós! E se nós não actuarmos, como podemos esperar que elas actuem?

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terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

O universo numa chávena de café



Aquilo que mais me agrada no universo é o seu desequilíbrio, a sua evolução e mudança constante, que fazem com que o conceito de estabilidade ou de eterno sejam uma anedota cósmica.

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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Luz




É curioso ver como na bíblia, logo no início, se fala em como deus criou o céu e a terra e, achando pouco, criou a luz, achando-a boa.
Por outras palavras, o divino criou coisas fotografáveis e, logo de seguida, criou a luz que as permite fotografar.
Assim, quem não respeitar e admirar a luz, bem a tratando e entendendo, nada entende do universo ou, se for esse o caso, do divino.



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Com F ou com PH



Primeiro
A coisa começou há muitos anos! Éramos – e eu os compinchas de várias andanças, incluindo a procura de perguntas e respostas – razoavelmente novos.
O caminho que então percorríamos juntos passava também pela fotografia. Partilhávamos os equipamentos, as técnicas, as estéticas os conhecimentos e descobertas que íamos fazendo. E, não sendo nenhum de nós génios, procurávamos também os livros e revistas onde pudéssemos ir beber em mestres o suficiente para os nossos passos.
Estávamos na década, melhor, no decénio de 70, inícios do de 80 e por cá, Portugal, pouca leitura havia em português sobre a matéria. Livros apenas alguns mais antigos, ao estilo de almanaques, e revistas só aquelas efémeras, cuja qualidade e pouca procura faziam morrer pouco depois de nascer.
A solução era, inexoravelmente, recorrer ao que vinha de fora, do Reino Unido, dos EUA, de França. Cada uma destas origens, então como agora, tinha abordagens diferentes às técnicas e estéticas e às soluções. E o hábito de ler, apreciar e mesmo falar ia-se atendo às línguas que praticávamos fotograficamente.
Claro que também contava, face à juventude que tínhamos, o prazer de usar um código semi-hermético aos circundantes, aqueles que não bebiam onde nós nos alimentávamos: o prazer de fazer imagens.
E criou-se a brincadeira, petulante é certo, de dizer que por cá se fazia “Fotografia” e que lá por fora se praticava “Photographia”.
Com o passar dos tempos e as variações de rumos das vidas de cada um, tudo isto se transformou ou diluiu. A literatura e os periódicos em língua portuguesa foram aparecendo, algumas por nós mesmos produzidas, muitas vindas de além-mar. E deixamos de parte a necessidade juvenil da afirmação por códigos e mistérios.
Mas a sensação da diferença entre “fotografia” e “Photographia” ficou. Já não agarrada à tradicional maledicência sobre tudo o que é português, mas antes para marcar alguma diferença no tipo de imagens produzidas, onde quer que fosse. Diferença esta que não está nas técnicas, nas estéticas ou nas temáticas. Constata-se em cada uma delas e no seu conjunto mas não reside aí.
Está, antes sim, na forma de pensar e de fazer fotografia.

Segundo
A representação pictórica, ou iconográfica, existe desde antes da escrita, com esta tem co-existido e, pela certa, a ela sobreviverá. Porque os códigos alfabéticos, fonéticos, ideográficos ou binários mudam com as civilizações e tecnologias, o que não sucede com o uso das belas-artes. Poderão estas mudar de estilos ou de interpretações, mas perduram.
O comum do ser humano, gregário que é mas igualmente desejoso de marcar a diferença na sociedade em que se insere, procura igualar ou suplantar aqueles que admira e a quem atribui qualidades superiores. Entre outros, os que bem se expressam, seja qual for a arte em causa. E a pintura e representação gráfica é uma delas. Mas ela não é tão simples como parece, já que, além do domínio das técnicas, implica um certo “fogo interior” que na maioria está apagado. Para já não falar na morosidade do processo.
Ao invés, a fotografia é quase imediata, por comparação. E é-o tanto mais quanto as técnicas usadas evoluem. Técnicas estas que, com um domínio não muito aprofundado, permitem obter resultados satisfatórios, não apenas perante a sensibilidade de quem as produz como a aceitação de quem as vê. E os automatismos contemporâneos ainda reforçam este facilitismo no fazer da fotografia.
Se a isto juntarmos o consumismo desenfreado que vamos vivendo e a necessidade de afirmação social mais pela posse de bens que pelo resultado daquilo que se é e se pensa, temos que meio mundo possui e utiliza câmaras fotográficas. E que o outro meio anseia por o ter e fazer.
Mas esta fotografia é feita a correr, oriunda em impulsos de momento, quase que por obrigação. As questões estéticas são ignoradas, dos factores de comunicação nem se desconfia, e com a mesma velocidade com que dispara o obturador, também o seu resultado é esquecido. Tão ou mais grave que isso, a fotografia contemporânea padece da efemeridade, já que o seu apagar ou destruir resulta do uso de uma ou duas teclas na sequencia de sistemas de armazenamento cheios. A mesma ausência de pensar no acto fotográfico conduz a uma ausência de importância no seu resultado. Conservar ou não uma fotografia é uma questão de apetite momentâneo. E já não se usam pastas de arquivo cuidadosamente arrumadas, caixas de sapatos empilhadas ou gavetas repletas de papéis mono ou multi-coloridos que, volte e meia eram remexidos e supostamente organizados.
Some-se a esta pouca importância dada ao pensar a fotografia o seu actual custo zero. Fazer uma fotografia ou dez consecutivas tem o mesmo preço e dá o mesmo trabalho em obter. Que o “rolo” já não chega ao fim e as memórias dos cartões são cada vez maiores.
Nos tempos que correm, a velha frase publicitária “Para mais tarde recordar” deixou de fazer sentido, face ao uso e importância que é dada à fotografia.


Terceiro
Alguns há, no entanto, que assim não procedem.
Ao olharem pelo visor da câmara, ou ainda antes disso, o seu objectivo é o registo permanente daquele jogo de luz e sombras, daquela perspectiva, o contar daquela história, o eternizar daquele momento. E que, em tendo oportunidade para tal, procuram melhorar as suas capacidades de o fazerem, tanto pela prática como pelo estudo de quem o faz ou fez ainda melhor. Em que a afirmação pela fotografia não passa pela competição com os restantes com base no resultado ou na exibição da factura do seu equipamento mas antes consigo mesmo e com o resultado obtido a cada imagem produzida.
E que sabem que esse processo começa com o olhar o assunto e termina com olhar sobre o produto acabado, sendo que tudo o resto que medeia entre um e outro são meras técnicas, mais ou menos dominadas. Na tomada de vista e na selecção e tratamento posterior.
Que sabem e praticam que uma fotografia é o resultado de um processo mental materializado pela técnica. E que é mais naquele que se preocupam que nesta.
Ao resultado dos trabalhos destes, chamo eu (e mais uns quantos não tão poucos quanto isso) “Photographia”. Para o trabalho dos demais fica o termo genérico de “Fotografia”. Alguns há, ainda, que diferenciam com o uso de maiúsculas e minúsculas, mas o significado é o mesmo.
Nenhum dos dois termos tem mais valor que o outro ou algum deles tem uma carga negativa. Porque, na vida, o que importa é a obtenção da felicidade naquilo que fazemos e nenhum método é universal ou único.
Mas porque não são iguais nem nos processos de obtenção nem nos resultados materiais, identifiquem-se umas e outras imagens e fotografias.
Até porque entre imagens fotográficas e fotografias (com “F” ou com “Ph”) também há diferenças. Mas isso são outros contos!

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domingo, 16 de fevereiro de 2020

causas e tijolos




Se, na vida, só fizermos aquilo de que gostamos, deixando para os outros as tarefas ou encargos de que não gostamos, pode ser cómodo e agradável.
Agora imagine-se que todos têm a mesma atitude e que ninguém gosta de, por exemplo, assentar tijolos.
Ou bem que não existiriam casas como as conhecemos ou bem que haveria um montão de gente frustrada, porque faziam o que não gostam. Mais ainda: revoltados contra os que deixam para eles as actividades de que não gostam e das quais não têm grande possibilidade de fugir.
Viver em grupo implica usufruir daquilo que de bom o grupo pode fornecer, mas também participar de todas as actividades e/ou necessidades do grupo. Mesmo que delas não gostemos.
Ou viver como ermitas.



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A fotografia é um ícone da realidade.
A partir deste dogma, podemos retratar a realidade com o registo lúmico do que nos cerca ou cercarmo-nos de objectos e situações que se substituam à realidade factual usando o mesmo processo de registo.
Importa, antes de mais, usar a luz e o seu registo, para exprimir emoções ou pensamentos.

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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

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Acidentes




Soube há pouco que numa fábrica aqui do meu bairro aconteceu um acidente grave: uma abundante fuga de monóxido de di-hidrogénio.
Felizmente que os trabalhadores sabiam o que fazer e os bombeiros, prontamente chamados e com os seus equipamentos para situações destas, conseguiram resolver a situação sem que sobrassem problemas de maior para a população.
Para os menos informados, lembro alguns dos problemas de tal produto: Principal componente da chuva ácida; Contribui para a erosão do solo; No estado gasoso pode causar queimaduras graves; No estado sólido pode provocar sérios danos em tecidos vivos; Encontrado em biópsias de tumores; Provoca a corrosão de diversos metais; Pode levar à morte se inalado; Utilizado em centrais nucleares; Consumido por atletas de elite para melhorar seu desempenho; Utilizado na fabricação de pesticidas, herbicidas, inseticidas, armas químicas e biológicas; Componente em alimentos (inclusive produtos para bebés) supostamente naturais; É um dos subprodutos da combustão de hidrocarbonetos.
Acrescente-se que, talvez por se tratar de um bairro suburbano ou por não terem acontecido fatalidades de maior, os media não dedicaram nem uma linha ao acidente.



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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

A notícia




Estávamos em Novembro de 2015. Para ser mais exacto, no dia 11 de Novembro de 2015.
No interior da Assembleia da República discutia-se e votava-se o programa de governo apresentado por Pedro Passos Coelho.
Cá fora, na praça em frente ao hemiciclo, duas manifestações: uma defendendo a aprovação, outra desejando fervorosamente que fosse rejeitado.
Entre ambas, um espaço, semelhante a uma “terra de ninguém, bem delimitado pelas autoridades policias com receio de eventuais confrontos. Que não aconteceram.
Quem podia ia relatando aos circundantes o que acontecia lá dentro, sabendo-o pela rádio. Com velhos transístores ou usando as modernas tecnologias dos smartfones.
Quando se soube do resultado, as palmas e os gritos de alegria brotaram de um dos lados, naturalmente. Daquele em que me encontrava.
Algures perto de mim, alguém gritou nesse espasmo de satisfação, uma frase que rapidamente se espalhou pela multidão, qual fogo em palha seca: “Já caiu, já caiu, vão p’ra puta que os pariu! Já caiu, já caiu, vão p’ra puta que os pariu!”. Ainda hoje, passados estes anos, me arrepio tal como nesse fim de tarde.
Nos tempos que correm, com a diversidade dos meios de comunicação, ainda é a rádio aquilo a que o comum dos mortais recorre quando quer saber algo em directo, em qualquer lugar e sem peias como cabos ou contractos de prestadores de serviços.
No dia mundial da rádio, bom será que tal não se esqueça!



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Este rádio era de meus avós.




Viviam eles numa casa de lavoura, no limite da aldeia e a electricidade não chegava lá. Ainda. Portanto, o rádio funcionava a pilhas.
Quando por lá ia, nas férias de verão, era uma das minhas companhias das tardes infindas, em que o calor apertava cá fora, mas o fresco provocado pelas caiadas e grossas paredes convidava a uma sesta musical.
Quando eu por lá não estava, onze meses e tal por ano, o rádio era ligado apenas duas vezes por dia, para que se ouvisse o “teatro radiofónico”, o antecessor das telenovelas de hoje. Mas quando o catraio lá estava – eu – o consumo de pilhas era substancialmente maior, pelo que ficava eu encarregue, da minha semanada, de as pagar, compradas na venda da aldeia, onde se ía umas duas a três vezes por semana, em busca de algum feijão, arroz, talvez sal, e dois ou três dedos de conversa com os patrícios. Claro que havia o dia em que vinha o homem do peixe, na sua motocicleta e anunciado de longe pela sua corneta.
E porque é que o rádio, na minha ausência, só se ligava para o teatro radiofónico? Porque o que mais que lá se contava, as notícias, eram sempre iguais: alguma inauguração governamental, informações, raríssimas, sobre a guerra lá longe, nas colónias, a previsão meteorológica, o vencedor do festival da canção e, casos bem raros, algum discurso ao país do títere. Nada de importante, que a política estava limitada à União Nacional, o partido sempiterno no governo. Não podíamos saber o que outros pensavam, os que outros diziam, o que outros faziam. E votar, então, se bem que não obrigatório, era quase que inconsequente, que os resultados se sabiam de antemão: vencia a União Nacional.

Os tempos mudaram, a electricidade chegou à casa de meus avós, foi acrescentado ao rádio, já não sei por quem, um transformadorzito, eu deixei de lá ir de férias, que a adolescência queria outras aventuras, e a União Nacional deixou de existir.
Veio a Democracia, a possibilidade de podermos decidir sobre o nosso próprio futuro, de escolhermos os nossos governantes, de ouvirmos na rádio e na TV o que outros fazem, dizem, pensam.
O rádio está aqui, testemunha muda porque já não funciona, do que foi, do que é e da transição dos tempos.
E se hoje temos os que temos, vivemos como vivemos e sofremos o que sofremos, não culpemos o rádio, que ainda tem a capinha diligentemente costurada por minha avó.
Culpemo-nos a nós mesmos, que podendo saber o que outros pensam, dizem, fazem, continuamos a escolher – quando vamos escolher – os mesmos de sempre. Mantemo-nos – ou muitos de nós – apáticos, não optando por mudanças realmente sérias, mas tão só por pequeníssimas nuances, que mais disto ou mais daquilo acabam por ser mais do mesmo.

Já não nos juntamos, à luz do candeeiro de petróleo, a ouvir o teatro radiofónico. Das notícias, quando as ouvimos, optamos pelas das catástrofes lá longe, preferencialmente, que nos sublimam os nossos problemas. Vibramos com as revoltas nos países ditatoriais, mas somos incapazes de resolver os nossos próprios problemas. Porque continuamos convencidos que o acto eleitoral está previamente decidido, entre o A e o B, e que, seja qual for o resultado, as consequências serão as mesmas.

Este rádio está mudo, agora. Mas de cada vez que para ele olho, ali na estante, grita-me ele que as mudanças estão na minha mão – na nossa mão – quer nas urnas quer no quotidiano. E que devemos passar de meros ouvintes do teatro radiofónico para o palco dos acontecimentos. De passivos a activos!
Que mais que ouvir a rádio devemos fazer ouvir a nossa voz! E fazer cumprir a nossa vontade!



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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Limite de liberdade




Liberdade é aquela coisa que desde sempre foi defendida por todos, individual ou colectivamente, mas sempre condicionada.
“A minha liberdade termina onde começa a liberdade dos outros” ou “Liberdade para todos menos para os inimigos da liberdade” são dois dos mais comuns conceitos que limitam a liberdade.
E a sociedade baliza a liberdade com normas e regras, numa tentativa vã de garantir a sua existência, sem se aperceber que na verdade a está a cercear.
O grupo e os seus líderes abominam aqueles que são ou procuram mesmo a verdadeira liberdade individual, não permitindo com leis que a encontre.
Uma das liberdades mais limitadas, se existente, a que versa a morte. A morte do próprio.
Porque é algo não reversível, porque é um escapar aos ditames sociais, porque é um gritar pela individualidade acima do colectivo.
O suicídio tem sido (e estou em crer que continuará a ser) censurado, condenado, proibido em quase todas as sociedades e culturas. Excepto quando a “honra” está em causa e mesmo essa é um obedecer às normas sociais.
E é tão condenado que se impõe aos próximos do suicida um manto de vergonha ou de consequências, que ficará para sempre, dure o que durar o “sempre”. Para que esse “peso” das consequências pese na mente de quem no suicídio pense e o não faça. Já que outro castigo não será possível.
A eutanásia ou suicídio assistido, de que agora se fala, tal como o suicídio solitário e autónomo, põe em causa o poder da sociedade sobre o individuo. Poder civil ou religioso, que é outra forma de exercer o poder sobre o individuo.
E tudo farão, aqueles que detêm esse poder, mesmo que disfarçando de liberdade, para continuar a impedir que alguém queira decidir sobre si e o seu futuro à margem das regras e do poder instituído.
Sou apologista que as causas que podem levar ao suicídio devem ser mitigadas ou anuladas. O sofrimento físico ou mental deve ser reduzido até ao valor zero.
Mas, e se apesar disso, a vontade de morrer se mantiver para além de qualquer dúvida, não deve ser contrariada. Nem directamente ao individuo nem rotulando e “punindo” os que lhe são próximos.
A quantificação da liberdade é a sua negação óbvia!



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terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Fotografia y verdad



Excerto da introdução do livro “El beso de Judas”, por Joan Funtecoberta

“Veamos un caso real como la vida misma. Mi hija Judit vino al mundo muy prematura, después de un embarazo de poco más de seis meses. Su peso alcanzaba tna solo 1,2 kilos y sus expectativas de vida eran tan precárias que debió permanecer tres meses en una incubadora. Cuando nació, en marzo de 1988, tuvimos además la desgracia de sufrir de un sistema hospitalário escandalosamente retrógado en temas de maternid. Los bebés prematuros eran concentrados en una sala especial, a cuyo interior los padres no teniamos acesso. Nos veíamos obligados a observar a nuestros hijos desde lejos, a través de varias mamparas de cristal de un laberintode incubadoras, y entre el trasiego presuroso de médicos y enfermeras que iban  de un lado a outro. Además, en el momento del parto Marta, mi mujer, estaba bajo los efectos de la anestesia y por lo tanto todavia no habia tenido oportunidade de conocer el rostro de su hija. Su ansieda era totalmente comprensible.
Se me ocorrió entonces que era el momento de sacar provecho de mi oficio. Di mi cámara a una enfermeira y le pedi que se acercase a Judit para tomarle vários retratos. Despyés de instruila brevemente en el manejo del enfoque y del exposímetro, la enfermera impresionó ocho negativos. Corrí a mi laboratório, revelé el rollo, hice una copia por contacto y volvi a toda a prisa al hospital donde marta seguia en cama como resultado del processo pos-operatorio. Era la primera vez que veía a su bebé de cerca y es fácil imaginar su ezcitación. Ella estaba contenta, yo estaba contento, todos estábamos contentos. Una vez más la fotografia habia puesto a prueba su función histórica de siministrar información visual precisa y fidedigna, hurra!
No obstante no podia evitar que una sospecha rondase por mi cabeza: Qué hubiese pasado si la enfermera se hubiera confundido de incubadora y por error hubiera fotografiado outro bebé? Probablemente hubiésemos quedado igual de complacidos. Habia yante necesiad, tanta urgência, tantas emociones contenidas, que cualquier reticencia hubiese equivalido a la impertinencia de un aguafiestas. En el film “La vida es un largo tío tranquilo” (1987), el primer largometreje de Etiene Chatilez, se nos cuenta una historia parecida: una comadrona, para vengarse de un médico del que está enamorada, intercambia a dos recién nascidos. Uno procede de una família humilde; el outro de una família burguesa. Doce anos más tarde se descubre el entuerto, lo cual provoca situaciones de gran hilaridade. Pero cuando nasci Judit yo desconocia este argumento.
Aquí las fotos nos mostraban indiscutiblemente a un bebé en el interior de una incubadora, todo el mundo lo reconoceria como tal. Pero para nosotros lo importante es que se trataba de nuestro bebé, un ser sobre el que estábamos ansiosos de volcar unos viscerales sentimentos paternales incluso sin haber visto su rostro. Pues bein, nada en las fotografias podía garantizarnos lo más importante: que fuese el nuestro. Nada en la imagen nos aseguraba lo que para nosotros era más vital. Para Roland Barthes “el punctum de una fotografía es ese azar que, en ella, nos afecta (pero que también nos resulta tocante, hiriente)”. El punctum nace de una situación personal, es la proyección de una serie de valores que proceden de nosotros, que no están originariamente contenidos en la imagen.
El potencial expresivo de cualquier fotografia se estratifica en diferentes grados de pertinência informativa. Es el salto arbitrário, aleatotio, contingente, de un grado al outro lo que asigna el sentido y da su valor de mensage a la imagen. Grado A: es un bebé; grado B: es-nuestro.bebé. Pasar frívolalente de A para B implica una pirueta muy sencilla pero que modifica substancialmente la vinculación de la imagen com su referente y por endes u valor de uso (recordemos la máxima “el sentido es el uso” de Ludwig Wittgenstein). Y sólo se trata de un tipo de intervención, entre muchas otras, que en su conjunto hacen tambalear del realismo fotográfico, mostrando la fragilidade de la verdade y de la verosimilitud.
…”

Imagem: by me

Silêncios



Roubado de um texto publicado pela Universidade Federal da Baía,
Escrito por Cassandra Barteló, ilustrado por mim

“O fotógrafo
Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta. Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava
entre as casas. Eu estava saindo de uma festa.
Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado. Preparei minha
máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada. Preparei minha máquina de novo. Tinha um perfume
de jasmim no beiral do sobrado. Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência
mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão. Olhei uma paisagem
velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre. Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakoviski – seu criador.
Fotografei a nuvem de calça e o poeta. Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa
Mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.
Manoel de Barros”

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Contradições


Está muita gente interessada nos vencedores dos prémios da academia de cinema. As apostas, as expectativas, o glamour, a indústria, os independentes contra o monopólio, os discursos…
Entretanto, lá como cá, continua a haver gente a catar no lixo para comer!
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domingo, 9 de fevereiro de 2020

Romani




Acredita-se que o povo Romani ou Shintos, por cá conhecido como Ciganos, tenha origem no norte da Índia.
Esta teoria baseia-se, entre outros factores, na questão da língua que se encontra entre as diversas comunidades ciganas espalhadas pelo mundo.
Sobre estes factos não há certezas, já que este povo, nómada e sem história escrita ou monumentos erguidos, baseia o conhecimento do seu passado na tradição oral.
Há ainda quem defenda que esta migração terá acontecido há pouco mais de mil anos, na sequência de um “rapto” de uma comunidade para a oferecer a um monarca algures na zona da Pérsia, devido às suas tradições de dançarinos e cantores. Algumas gerações depois, terão sido expulsos e, não podendo regressar à sua terra de origem, migraram para norte, para as zonas do mediterrâneo e Europa, tendo daqui expandindo-se pelo resto do mundo. Uma das zonas onde terão feito uma paragem mais prolongada, e onde terá ficado uma maior comunidade terá sido a zona dos Balcãs.
Daqui também a confusão que se instalou entre o povo Romani e o povo Romeno.

O comportamento deste povo nunca foi o de integração total com as populações dos territórios que atravessavam ou onde se fixavam.
Mantendo hábitos nómadas, porque lhes era impossível aquirir terra, com leis próprias no seio da sua comunidade, com regras fechadas a estranhos, as suas actividades económicas não passavam pela indústria, agricultura ou pastorícia. O comércio ambulante, aliado à actividade de saltimbancos terá sido a prática dominante.
A sua itenerancia e os seus hábitos não coincidentes com as populações autóctones eram frequentemente associados a crimes ou delitos de propriedade ou de sangue. É bem mais fácil culpar um estranho que não se integra ou que não tem residência fixa que um vizinho ou conhecido.
Assim, os rumores passaram a suspeitas e estas a acusações frequentes e generalizadas. E o fosso entre povos e culturas foi aumentando, criando o mito de gente perigosa a evitar. E do mito à legislação. Alguns países europeus chegaram mesmo a proibir a existência no seu território de gente cigana a menos que renunciassem à vida nómada e adquirissem terra para se fixarem. E isto não há tanto tempo quanto isso. Em qualquer dos casos, foram sempre sendo marginalizados ou expulsos.
E vice-versa! Numa tentativa de manter a sua cultura e identidade enquanto povo, os ciganos foram-se mantendo à margem dos usos e costumes locais, reservando para si tradições próprias e fechando-se às influências externas. Língua, vestuário, crenças e religião, hábitos sociais, solidariedade ou rivalidade entre famílias, foram mantidos e resolvidas entre si, sem o recurso às comunidades circundantes ou atravessadas.

Esta exclusão recíproca ainda hoje se mantém arreigada nas mentes comuns. Encontrar um grupo de ciganos na rua ou nas estradas é motivo de algum receio, mantendo-se os contactos ao comércio e pouco mais.

Esta marginalização e perseguição tiveram o seu auge, na história recente, na “Shoah”.
Este é o termo dado pela comunidade hebraica ao holocausto judeu feito pelos nazis. Fala-se de seis milhões de judeus barbaramente mortos nos campos de extermínio. Mas raramente se cita o que se supõe terem sido 800.000 ciganos igualmente chacinados nos mesmos locais e da mesma forma.

O que faz então com que a história diferencie um de outro povo?
Para além dos números, qualquer um deles aterrador, é talvez a forma como cada um deles interage com a sociedade circundante. Que os seus passados são semelhantes, nas diásporas e perseguições, marginalizações e execuções. Sociais e legais.
Suponho que o poder económico de um em comparação com o outro, que é francamente superior. Não apenas nas actividades a que se dedicam como no poder de influenciar a sociedade de acolhimento (hoje a isto chama-se lobby).
Veja-se, por exemplo, que duas das principais exportações de Israel são o software e diamantes. No entanto, naquela zona do globo não existem diamantes, sendo estes uma das suas principais importações.
Este poder económico, que não é restrito ao médio oriente mas antes que se espalha por toda a sociedade ocidental, é poderoso o suficiente para moldar opiniões através dos media.
Com eles e com os comportamentos do poder político, criou-se uma sensação generalizada de culpa ocidental a propósito do passado judeu, que não existe sobre o passado cigano.

Pergunto-me se, por um qualquer acaso, a sociedade ocidental (europeia e norte americana) repetisse o disparate histórico da criação artificial de um país, mas desta vez na Índia e com o povo Romani, se existiria a mesma condescendência ou tolerância para com actos bélicos ou de exclusão por eles efectuada sobre os povos ali existentes ou vizinhos. Como acontece hoje com Israel.

A história do Homem está repleta de vergonhosas acções de domínio violento de um povo sobre outro. Foi o caso das Africas e dos escravos, da Austrália e dos aborígenes, dos EUA e dos Índios, das Américas central e sul e dos pré-colombianos.
Acrescente-se que a guerra mais longa de que tenho conhecimento travou-se naquilo a que hoje chamamos Chile, entre os conquistadores espanhóis e o povo Machupe, durante mais de 300 anos. E que este povo, hoje, vive numa quase reserva nas zonas inóspitas e frias da Patagónia.

O bicho-homem não aprendeu com a história.
E se lamenta e pede desculpa pelos erros do passado, continua a praticá-los no presente, neste ou naquele ponto do globo, com o beneplácito de grandes potências mundiais.
Mas as atrocidades de então não justificam as de hoje. Quer se trate da Servia, do Vietnam, de Timor, do Darfur, do Iraque ou de Israel.

Se eu tivesse ou pudesse escolher entre ser judeu ou romani, certamente que escolheria este último.
Porque, e como alguns deles afirmam: “O Céu é meu tecto; a Terra é minha pátria e a Liberdade é minha religião”.

Que a liberdade não tem casa, bandeira ou templo!



By me

À prova de idiota



Uma das perguntas que oiço com mais frequência é “Que câmara recomendas?”
A minha resposta, se tenho alguma confiança com quem fala, é em regra algo deste género “Todas e nenhuma!”, seguida de umas perguntas “Qual o orçamento disponível, que tipo de fotografias queres fazer?”
É que tenho para mim que não há câmaras multi-uso, válidas para todas as circunstâncias. Multi-usos mesmo, quase perto da perfeição, só mesmo o canivete suíço e o isqueiro Zippo.
Do meu ponto de vista, a fotografia nasce dentro do fotógrafo, que vê com os olhos da cara e com os olhos da alma o que está à sua frente e imagina como quer que isso fique registado, usando para tal a ferramenta que possui. Neste processo, o conhecimento das capacidades da sua ferramenta – a câmara e o tratamento posterior – é vital!
Distâncias focais e de foco, profundidades de campo e sensibilidades, acesso e flexibilidade dos respectivos comandos, suporte final, peso, volume, sustentação…São estes alguns dos factores que condicionam o seu uso.
Para alguém que não os saiba, todas as câmaras são inúteis, caras e complicadas. Para quem os conheça e saiba tirar partido do que dispõe, todas as câmaras são boas.

Havia, em tempos recuados, um anúncio televisivo já não sei a quê que usava da seguinte frase “Não mate leões com fisga nem moscas com carabina!” No caso da fotografia, poderia eu dizer: “Não faça reportagem de guerra com view-camera nem macro de natureza com compacta!”
Mas não significa isto que não seja possível! Faz muito que não trabalho com grande formato e nunca estive em situação de conflito armado.
A fotografia que acompanha estas linhas foi feita em 2004 com a há muito descontinuada Olympus Z3030, compacta de 3,3 MP, com uma objectiva de três vezes e com todos os controlos manuais (tempo, abertura, foco, etc.) dependentes do uso de cinco botões. Mais ainda, a verificação manual de foco é feito no visor de LCD, sempre com um aumento digital da imagem e um rigor muito pouco exacto.
No entanto, a familiaridade com a câmara permite ultrapassar a maioria das dificuldades. No caso, ela estava colocada num tripé, o caule da flor fixo com uma mola de roupa sustentado por um braço articulado improvisado e agarrado no tripé e a garantia de foco feita com uma fita métrica e não pelo visor.
Os fabricantes de equipamento fotográfico tentam simplificar os processos, compactando as câmaras e automatizando-as, criando os modelos a que chamaram de “Bridge”. Criam aquilo a que eu chamo de “Câmaras à prova de idiota”, em que os automatismos se substituem ao fotógrafo. Mas ainda não criaram um modelo de fotógrafo à prova de câmara.
Fotografar significa, antes de mais, conhecer o assunto e a ferramenta e antecipar o resultado final. O resto é uma questão de prática e de luz.
Divirtam-se e aproveitem-na bem – a luz!

By me

sábado, 8 de fevereiro de 2020

D'arquivo



Patranhas

Estávamos no ano de ‘98. Decorriam os saudosos Encontros de Fotografia de Coimbra, espalhando fotografia e fotógrafos por toda a cidade. Um dos espaços usados era o emblemático “Edifício Chiado”, bem no centro da cidade.
Esta história passou-se nele, já depois do seu restauro.

A exposição era sobre um cosmonauta soviético e a fundação Sputnik.
Nas paredes e nas vitrines, no centro da sala, abundavam fotografias do herói, fardado ou à civil, quando pequeno ou junto aos seus camaradas de armas e de curso.
Constavam também recortes de jornal, livros de estudo, cadernos de apontamentos e cartazes alusivos à sua viagem. Entremeados com estes documentos, elementos da sua farda e divisas, óculos, carteira e outros objectos pessoais e, se a memória me não falha, pedaços do seu fato espacial e do simulador onde terá treinado.
Tudo isto era acompanhado de legendas em inglês, que identificavam cada uma das peças, recortes e fotografias, que nos seria difícil de entender a língua russa em que estavam escritos.
No final da exposição, um cartaz com letra miúda, onde nos era passado um atestado de… ingenuidade!
Todo aquele estendal de livros, fotos, recortes e objectos diversos mais não era que um fenomenal embuste.
A pessoa ali retratada nunca tinha sido cosmonauta, nem sequer militar ou mesmo russo e todos os documentos, fotografias e objectos eram falsos.
O público, ao ler esta explicação, ria, sorria ou franzia o cenho, incomodado com a sua própria credulidade e por ter sido enganado.
Mas não o tinha sido!
Foram os próprios que atribuíram um valor real ao que estavam a ver, que acreditaram nas legendas numa língua estranha, já que não entendiam o original e que quiseram, no seu íntimo, que tudo aquilo fosse “verdade”.

Perguntava-me, um destes dias, um estudante de comunicação se eu admitia a manipulação da imagem, fotográfica ou não.
Claro que admito, aceito e recomendo.
O problema, a existir, nunca está na imagem por si só mas antes na leitura que dela fazem autor e público!
Se ambos dizem ser verdade aquilo que está exibido, e se essa afirmação não é posta em causa, então a patranha passa a verdade, eventualmente desmontável mais tarde, e com todas as suas consequências.
Mas se não for assumido por parte do autor um carácter de veracidade, se não lhe for dado o carácter de “documento”, então tem tanta validade quanto as esculturas que se fizeram ou fazem de Moisés que, tanto quanto sei, nunca foi retratado em vida.


Texto: by me
Imagem: uma das fotos da exposição, publicada num suplemento de um jornal como divulgação dos “Encontros”

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Velharias




Surgiu numa questão sobre fotografia.
Alguém falou em “cabo disparador”, ou “bicha disparador”. E mostrou a imagem de um.
Um êmbolo numa das pontas que empurra, na outra ponta, um pequeno veio. Colocado no botão de disparo na câmara, permite actua-lo sem o pressionar.
Vital para poses longas ou mais ou menos longas, reduzindo substancialmente a possibilidade de a câmara vibrar pela acção do dedo.
É igualmente útil para aceder ao botão disparador, caso este esteja num local de acesso mais difícil.
Para além dos descritos, os mais comuns, existem estes, como os da imagem.
O efeito é o mesmo mas, no lugar de se premir um êmbolo, aperta-se uma “pera” que pressiona ar que, por sua vez, irá actuar no veio.
Tem a vantagem de poder ter um comprimento razoável.
O que possuo tem quase dez metros, coisa difícil de funcionar com os de “bicha”, pelo menos com facilidade.
Nos tempos que correm, este tipo de objecto, de bicha ou pneumático, é praticamente inútil, já que as câmaras digitais não têm onde os usar. Em alternativa, quase todas permitem disparadores à distância, que por cabo, quer por infravermelhos.
Mas como gosto de conservar quase tudo aquilo que usei em fotografia, este está bem guardado.



By me

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Saber optar



Um dos “truques” surgidos com a fotografia digital é, mais que saber o que ou quando fotografar, decidir o que ou quando não fotografar.
Que a facilidade e o baixo custo da obturação digital, junto com o terrivelmente fácil destruir de imagens, leva a que muitas fotografias sejam feitas quase que sem pensar no resultado final.
Saber fazer e quando fazer é importante. Saber quando não fazer, é igualmente importante!

By me

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Looking back




Excerto da obra “Modos de ver” de John Berger.
Editado por “Edições 70”, na colecção “Arte e comunicação”, Lisboa, 1999


“(…)
Uma imagem é uma vista que foi recriada ou reproduzida.

É uma aparência, ou um conjunto de aparências, que foi isolada do local e do tempo em que primeiro se deu o seu aparecimento, e conservada - por alguns momentos ou por uns séculos.

Todas as imagens corporizam um modo de ver. Mesmo uma fotografia. As fotografias não são, como muitas vezes se pensa, um mero registo mecânico. Sempre que olhamos uma fotografia tomamos consciência, mesmo que vagamente, de que o fotógrafo seleccionou aquela vista de entre uma infinidade de outras vistas possíveis. Isto é verdade mesmo para o mais banal instantâneo de família. O modo de ver do fotógrafo reflecte-se na sua escolha do tema. O modo de ver do pintor reconstitui-se através das marcas que deixa na tela ou no papel. Todavia, embora todas as imagens corporizem um modo de ver, a nossa percepção e a nossa apreciação de uma imagem dependem também do nosso próprio modo de ver.

(Por exemplo, Sheila pode ser uma entre vinte pessoas; mas, por motivos pessoais, só temos olhos para ela.)

As imagens foram feitas, de princípio, para evocar a aparência de algo ausente. A pouco e pouco, porém, tornou-se evidente que uma imagem podia sobreviver àquilo que representava; nesse caso, mostrava como algo ou alguém tinham sido - e, consequentemente, como o tema havia sido visto por outras pessoas. Mais tarde ainda, a visão específica do fazedor de imagens foi também reconhecida como parte integrante do registo. A imagem tornou-se um registo de como X tinha visto Y.

Constituiu isto o resultado de uma crescente tomada de consciência da individualidade, acompanhada de uma crescente consciência da história. Seria ousado pretender datar com rigor este último avanço. No entanto, pode afirmar-se com certeza que esta consciência existe na Europa desde o início do Renascimento. Nenhuma outra espécie de vestígio ou de texto do passado nos pode dar um testemunho tão directo sobre o mundo que rodeou outras pessoas, noutros tempos. Sob este aspecto, as imagens são mais rigorosas e mais ricas que a literatura. Esta afirmação não nega a qualidade expressiva ou imaginativa da arte, como se a considerássemos uma mera prova documental; quanto mais imaginativa é a obra, mais profundamente nos permite compartilhar da experiência que o artista teve do visível.
Ainda assim, quando uma imagem é apresentada como obra de arte, o modo como as pessoas olham para ela é condicionado por toda uma série de pressupostos adquiridos sobre a arte. Pressupostos que se ligam a:

Beleza
Verdade
Génio
Civilização
Forma
Estatuto Social
Gosto
etc.

Muitos destes pressupostos não se encontram já ajustados ao mundo tal como ele é (o "mundo tal como ele é" é mais do que um puro facto objectivo: inclui também a consciência). Em desacordo com o presente, estes pressupostos obscurecem o passado. Mistificam, em vez de clarificar. O passado nunca está pronto a ser descoberto, reconhecido, exactamente como foi. A história reconstitui sempre uma relação entre um presente e o seu passado. Por consequência, o medo do presente conduz à mistificação do passado. O passado não serve para se viver nele; é uma mina de conclusões que utilizamos para agir. A mistificação do passado arrasta consigo uma perda dupla: as obras de arte tornam-se desnecessariamente remotas; e o passado dá-nos menos conclusões a completar com a acção.


Quando "vemos" uma paisagem, situamo-nos nela. Se "víssemos" a arte do passado, situar-nos-íamos na história. Quando nos impedem de a ver, estamos a ser privados da história, que nos pertence. A quem lucra esta privação? Ao fim e ao cabo, a arte do passado vem sendo mistificada porque uma minoria privilegiada se esforça por inventar uma história que possa justificar retrospectivamente o papel das classes dirigentes e porque tal justificação já não faz sentido em termos modernos. Por isso, inevitavelmente, mistifica.
(...)

Imagem: by me