sexta-feira, 15 de março de 2019

Arte e política




Parece que há gente ligada à política e aos partidos que estão escandalizados com uma declaração de uma artista portuguesa.
De acordo com o que li num jornal, Leonor Antunes foi escolhida por concurso para representar Portugal na bienal de Veneza. E terá afirmado, e cito, “A situação no mundo é triste, com países que estão a tornar-se regimes fascistas e populistas. Se tivéssemos um regime diferente, de direita, nunca teria aceitado o convite. Se estivesse o PSD ou o CDS no governo, não aceitaria. Embora sejam partidos democráticos, defendem valores em que não acredito.”
Há partidos que, de um modo mais explícito ou mais discreto, comentam negativamente esta declaração, havendo mesmo quem queira excluir a sua autora da participação no certame.
Esquecem-se todos eles que a Arte, seja qual for o seu suporte, plástico ou não, é sempre uma intervenção política. De concordância ou discordância da vida, dos costumes, das leis, dos actos humanos.
E esquecem-se que a Arte, seja qual for o seu suporte, deve que agitar as consciências, fazer pensar (muito ou pouco), criar algo de novo. Quando não, deixa de ser arte para ser a execução sistematizada de códigos de expressão pessoal ou colectiva. E passa a ser uma sensaboria académica, respeitadora de normas, veneranda e obrigada aos lentes e poderosos.
A Arte tem sempre ideias associadas. E isso é ser político. Dissociar a arte da intervenção social, da simpatia ou antipatia por correntes de pensamento e suas práticas, é transformar o que é produzido em artigos de linhas de produção, que têm tanto de artístico e criativo quanto fotocópias.
E os seus autores, os artistas, têm o direito – e o dever – de se identificar com a política vigente. De colaborarem, positiva ou negativamente, com a sociedade em que se inserem, de agitar mentalidades, de obrigar a pensar e a mudar o que entendem por retrógrado ou pernicioso.
Um artista ou criador dizer que não colabora com um regime ou grupos de pessoas que pensam de forma notoriamente diferente no que concerne à sociedade é, não apenas um direito como um dever em defesa daquilo em que acredita.
O próprio facto de os partidos políticos se sentirem afectados por tal declaração e querem afastar um artista do sistema reforça a necessidade e o direito de o dizer e de actuar em conformidade.
Não conheço a artista, Leonor Antunes. Nem pessoalmente nem o seu trabalho. Mas, asseguro, fiquei com vontade de conhecer e de lhe dar o meu aplauso, gostando ou não das suas obras.


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