sexta-feira, 27 de março de 2009

Sorrisos!


- Olha, sabes guardar um segredo?
- Claro!
- Anda cá então. Mas olha que ainda é segredo.
- Sim, mas o que se passa?
E ela, quando se me lhe cheguei, alisou e esticou o vestido por cima do ventre. E sorriu para mim como ainda não o havia feito nos já quase quatro anos que partilhamos o emprego.
Claro que fiquei radiante. Nada tinha contribuído para aquela situação, mas sabê-la grávida pela segunda vez, mais a mais sabendo que havia havido algumas confusões no casal, foi bom de saber. Tanto mais que ela parecia estar satisfeita com o seu estado.
- De quanto tempo, perguntei.
- Dois meses. Soube-o hoje mesmo! Mas olha que ainda é segredo!
Claro que mantive o segredo, ou não teria eu sido merecedor da sua confiança.

Um ou dois dias depois, que eu andava esquecido, perguntei-lhe para quando seria o nascimento.
- Lá para finais de Setembro. Respondeu-me sorrindo
E acrescentou, com um semblante profundamente triste:
- Mas já cá não deverei estar por essa altura!
Naturalmente que quis saber o que se passava e fui esclarecido:
O contrato de trabalho com a empresa fornecedora de serviços terminará em Junho e, em sabendo-a eles grávida, pela certa que não o renovarão. Assim tinha sido aquando do seu primeiro filho e só muito a custo tinha dado a volta à questão.

O que acima está descrito é verdadeiro e tão fiel quanto a minha memória mo consegue recordar. Tal como não consigo esquecera raiva ou fúria que senti então, tal como agora, perante a situação delicadíssima que ela e o marido estão a viver. Tal como as decisões várias que lhes devem ter atravessado a mente, confrontados com a situação laboral e a eventualidade de terem mais um filho.
E vou tentar por de lado o facto de ser seu amigo e de o seu sofrimento me afectar.
Vou igualmente por de lado o facto de trabalharmos numa empresa que afirma, no final de cada anúncio de concurso interno para preenchimento de vagas numa dada função: “Esta empresa pratica uma política de igualdade entre homens e mulheres.”
Também vou pôr de lado esta situação acontecer na altura em que as instâncias políticas nacionais tentam sensibilizar a população para a necessidade de as mulheres fazerem parte activa da vida política e das listas de candidatos às eleições que se avizinham.
Vou falar apenas em questões de muito maior prazo e abrangência:
Se o país está a envelhecer, com aumento da esperança de vida e diminuição de nascimentos e se isso cria vários e graves problemas que se antecipam, desde logo a haver mais gente a consumir recursos que a produzi-los, então que raio de atitude é esta a da sociedade actual que não precavê o futuro? Numa análise muito materialista, novas crianças são novos escravos de trabalho, com ou sem contrato, que continuarão a alimentar as empresas contratadoras e o aparelho público com os impostos que pagarão. Será, no mínimo, absurdo não se plantar hoje mas querer ter a colheita amanhã!

Pela parte que me toca não ficarei quieto!
E se tiver que usar métodos pouco ortodoxos ou menos recomendáveis para que não torne a ver aquele olhar triste de partir o coração, não hesitarei.
Porque, no fim de contas, solidariedade não pode ser apenas uma palavra bonita, usada quando convém!
E é tão bom ver alguém sorrir de felicidade!


Texto e imagem: by me

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