sexta-feira, 26 de setembro de 2025

Saudades e qualidades




O bairro de Alvalade em Lisboa faz parte da minha existência, pese embora nunca nele tenha vivido. Todo o meu percurso estudantil aconteceu nele, pré e pós revolução, com quase tudo o que ambos períodos implicaram.

Mas, e para além disso, o bairro de Avalade, com os seus mais de três quartos de século, não surgiu de um juntar de edifícios e de ruas entre eles.

Foi delineado por arquitetos e outros, com traças comuns mas distintas, com diversas tipologias, custos e classes sociais bem diferenciadas, com serviços de apoio variado, com zonas comerciais, habitacionais e industriais, incluindo um campo de jogos de notória dimensão. Mesmo a igreja, que encima o bairro e dá nome a uma avenida no local, é inconfundível. Havia quem apelidasse o bairro de Alvalade como “A cidade dentro da cidade”.

Mas foi um bairro que foi morrendo aos poucos, com o envelhecimento da população, com as mudanças de hábitos de consumo, com o aumento das viaturas privadas ou colectivas que transformaram as largas avenidas em ruas quase estreitas.

Nos últimos anos tem-se vindo a notar que o bairro, que estava quase moribundo mas bem conservado, está a renascer. Agora encontram-se muitas mais crianças em carrinhos ou ao colo, as tradicionais esplanadas vão-se tapando, convertidas em restaurantes da moda ou franchising, alguns de origens e ementas transfronteiriças, havendo ainda as clássicas drogarias e farmácias, pronto-a-vestir e frangos assados e, em chegando a época, castanhas assadas na rua e escuteiros a vender porta-chaves e canetas.

Uma das principais mudanças no bairro começa (ou acaba) aqui, no que se vê na fotografia: a zona industrial.

Aos poucos, as fábricas e oficinas, naturalmente com áreas generosas, foram-se extinguindo, dando lugar a zonas com nomes conhecidos de supermercados, a zonas de culto não tradicionais por cá e até a produtoras e difusoras de televisão temáticas.

Vem tudo isto a propósito de, e para além de uma ida ao coração do bairro, ter feito uma aquisição também de “saudade”: a objectiva que aqui usei.

Trata-se de uma Tamron SP adaptall2 300mm 1:5,6, objectiva quase topo de gama no seu tempo (finais de ’70, inícios de ’80) de que fui um orgulhoso e feliz dono. Um pouco pesada (610g) e sem suporte directo para tripé, exigia e exige algum cuidado no seu uso em mão livre. Mas, dominada esta questão, devolvia-nos uma imagem de qualidade superior, tanto na época como ainda hoje.

A vida deu muitas voltas e, numa delas, vi-me na contingência de a vender. Acto de que sempre me arrependi. Não apenas porque não gosto de me desfazer do que tenho mas também por aquilo que ela me permitia.

Por estes dias e meramente por acaso encontrei quem e onde vendesse um exemplar, em óptimas condições e preço muito aceitável. Não resisti!

Excluindo a fotografia de teste, feita no exterior da loja, esta foi a primeira com um “amor antigo”, recordando outros tempos, outros amores e outras práticas.

Tal como o bairro, também a minha prática fotográfica vai rejuvenescendo em cima do que já foi novo e que continua muito bom.

 

Pentax K7, Tamron SP Adaptall2 300mm 1:5,6


By me

Sem comentários: