segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Éticas




É verdade que sim: tenho uma opinião muito pouco lisonjeira sobre a chamada “fotografia de rua”. Há todo um conjunto de questões éticas que me levam a tal.

Em qualquer dos casos, de quando em vez há que pensar e repensar sobre os nossos conceitos. Colocá-los em causa, rever argumentos, aceitar como válidas outras perspectivas. Pode sempre acontecer que o que temos por certo desde há muito acabe por se demonstrar errado.

Por isso mesmo estive este fim de semana numa palestra onde o tema era Fotografia de Rua, defendido por quem a pratica. Tentei estar de mente tão aberta e tão ausente de preconceitos quanto o possível.

O que fui ouvindo até parecia lógico e aceitável, com algumas abordagens técnicas e éticas válidas e algum tipo de separação entre a satisfação do fotógrafo e o respeito pelo fotografado. Quase me convenceu.

E digo quase porque o orador “borrou a pintura” com uma das fotografias que exibiu: um homem barbudo e com cara de zangado, numa bicicleta e acompanhado por dois cães, fazendo um inequívoco e bem visível pirete para a câmara. A grande angular usada e perspectiva próxima e baixa usada não permitiam não ver o gesto de protesto para com o fotógrafo e o que fazia.

Interrompi o discurso e questionei porque motivo, sendo bem notório o protesto contra o fazer daquela fotografia, se ignorava a vontade do fotografado e se a exibia.

A resposta esteve bem em linha com o que eu pensava antes de entrar naquela sala: “Sim, mas eu gosto tanto dela...”! “E”, acrescentou alguém que estava presente aquando do fazer da imagem, “o homem não voltou atrás para protestar.”

Toda a capa protectora que eu tinha a envolver os meus preconceitos e opiniões se esbroou. Que estava ali bem plasmada a relatividade de importâncias entre a vontade do fotografado e a vontade do fotógrafo. E a ausência de escrúpulos deste perante aquele.

É interessante pensarmos que o acto de premir o obturador da câmara fotográfica é conhecido por “disparar”. Como quem dispara a caçadeira sobre a sua presa. Cujo troféu se pendura na galeria, real ou virtual, demonstrando a habilidade ou saber do caçador.

 

Pentax MX, Pentax-M 28 1:2,8, TriX, 24/12/1979

 

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