Volta e meia oiço – ou leio – sobre casos que conto
aqui ou ali:
“Então e não fotografaste? Tu, logo tu, sempre com a
câmara contigo, não fotografaste!?”
A frequência com que me vou deparando com esta
afirmação/interrogação vai aumentando, à medida que o tempo passa.
Efectivamente, cada vez menos fotografo o que assisto!
Existem em mim dois fotógrafos que se digladiam face
às ocorrências: o bio-químico e o foto-mecânico.
Cada vez mais o primeiro tem relutância em deixar o
segundo actuar perante a actividade humana. Aquilo que o segundo pode ver e,
eventualmente, registar com a sua objectiva é infinitamente menos que aquilo
que o primeiro constata.
Os cheiros, os sons, os sentimentos do dia-a-dia são
tantos, tão apelativos, tão inebriantes, tão envolventes que, se todos eles
passassem para a câmara, nada mais faria. Seria como aqueles turistas que vão
de férias e visitam os locais pelo visor, e apenas por ele. Vi alguns assim na
Expo98, por exemplo.
Se a magia da fotografia, a grande magia, é o contrair
do tempo do antes e do depois para o durante a exposição efectuada, que duração
teria uma exposição que englobasse a vida?
Se a fotografia faz parte da minha vida – e faz
indubitavelmente – procuro fotografar com os olhos e, em havendo oportunidade, encontrar
algo que, de alguma forma, transmita o que vi e/ou senti.
São ícones fotográficos o que vou fazendo, não
procurando reproduzir realidade que não apenas a minha realidade. A minha forma
de ver a realidade.
A fotografia documento - e as actuais tecnologias cada
vez mais o incentivam – retiram-lhe validade. Já perdi a conta das vezes em
que, confrontado alguém com fotografias minhas, me perguntou se a tinha
trabalhado no photoshop. A credibilidade de uma fotografia, da fotografia, já
não existe. Supondo que alguma vez existiu.
Por isso, quando vejo/vivo algo, prefiro gozar esses
momentos, “fotografando” na “película” a que chamamos cérebro e guardar para
mais tarde a materialização do todo que vi e senti.
Estou em crer que deixei de ser fotógrafo. O que sou?
Nem eu sei bem!
Talvez um medíocre espectador com uma ferramenta que
não domina.
By me
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