domingo, 27 de março de 2022

Canetas e escritas




Eu sei que é quase um anacronismo.

Em tempos em que é mais comum escrever em teclas reais ou virtuais, eu transporto sempre comigo o como verter ideias com tinta sobre papel. E o respectivo papel. Tal como tenho comigo quase sempre uma câmara fotográfica, apesar de ter no bolso um smart qualquercoisa que também faz registos lúmicos.

São velhos hábitos, mas eu não vou para novo!

Idealmente a forma de escrever que tenho comigo é uma caneta de aparo, também conhecida por “de tinta permanente”.

O motivo deste segundo nome provém de há uns anos valentes, bem antes de eu ter sequer nascido: usava-se então canetas de aparo mas com o depósito de tinta em cima da mesa. Mergulhava-se aquele neste, à medida em que a tinta retida na ponta metálica se ia gastando. A inovação, creio que no primeiro quartel do séc. XX foi a introdução de um depósito de tinta no suporte do aparo.

Aprendi a escrever com caneta de tinta permanente, com grande gasto de sabão para retirar as manchas de tinta das mãos e da bata escolar.

Hoje a maioria não transporta consigo nada que permita escrever em papel: nem caneta nem esferográfica nem lápis. Eventualmente tem um destes utensílios na sua mesa ou gaveta. No trabalho e para situações pontuais, quem me conhece procura-me, pedindo-me o empréstimo.

E ficam aborrecidos se, ocasionalmente, lhes digo que não posso emprestar. E justifico: “Hoje só trago caneta e não esferográfica. E a caneta não empresto.” Em havendo tempo, explico que não se trata de sovinice mas antes de questões técnicas e específicas das canetas de aparo.

O aparo, usado regularmente pela mesma pessoa, ganha “cama” ou deformação pela posição e pressão regular do seu utilizador. E cada um tem uma posição – ângulo, pressão e rotação – diferente de todos os outros.

Em deformando a “cama” habitual é quase impossível que ela regresse, passando o aparo a ser agressivo para com o papel, perdendo a suavidade da escrita e passando a arranhar o papel, no lugar de apenas nele depositar a tinta.

É por isto que costumo trazer comigo uma esferográfica. No mesmo bolso e ao lado da de aparo. Para não recusar o empréstimo, se mo fizerem. Poupo suscetibilidades e poupo aquilo que gosto de usar.

Se perguntarem aos antigos que ainda usam canetas de tinta permanente, ou que as usaram, eles concordarão comigo. Nas práticas e nos motivos.


By me

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