Era noutros tempos. Em boa verdade, em tempos de má
memória.
Mas, mesmo nesses tempos, muito se aprendia e muito
serviu de base ao que somos hoje. Ainda que nem sempre da melhor maneira.
Uma das coisas que se consumiam em minha casa eram
jornais. Não muitos, que o dinheiro não abundava. Não muitos, que a maioria das
notícias chegavam-nos após o lápis azul da censura. Mas alguns.
E, durante algum tempo, o Diário de Lisboa fazia a sua
aparição em casa regularmente aos sábados.
E se outro motivo não houvesse, as crónicas da
“Guidinha”, de Luís de Sttau Monteiro eram lidas com sofreguidão.
Aprendi a lê-las com os adultos. Aquela forma de
escrita, sem pontuação alguma que não fosse o ponto final no fim da crónica,
era algo que atrapalhava qualquer um a ler.
Mas foi também com isso que aprendi a ler nas
entrelinhas, que aprendi o que era a interpretação de um texto para teatro, o
que eram outras vidas e censuras que não as do meu próprio bairro e escola.
Os meus professores de Português não gostavam, quando lhes
apresentava redacções com as ideias tão intercaladas, tão baralhadas, que
poderiam ter mais que uma leitura. E tinham! Excepto uma professora, de quem eu
não gostava nem um nico, mas que ficava a olhar p’ra mim meio de lado e com um
muito ligeiro sorriso.
Não creio que aquela escrita ou estilo hoje tivesse o
sucesso que teve então. Já não há que esconder ideias de censores absurdos, os
jornais já não são consumidos da forma que eram e a própria leitura está a
perder terreno face às tecnologias de informação.
Mas parar para pensar perante um texto, tentar
descobrir-lhe o escondido, rirmo-nos daquilo que não podemos contar fora de
portas…
Outros tempos!
Surge esta memória a propósito de um pequeno diálogo
tido on-line com alguém que teve a sorte de já não ter que recorrer a esta
forma saber as notícias.
No meio de tudo isto, a minha tristeza é nem
desconfiar do local onde tenho guardado o livro que re-editou algumas dessas
crónicas.
Fica a imagem da capa, palmada da net.
By me