quinta-feira, 30 de abril de 2009

Girando


Nem sempre as coisas vêm quando, como e onde queremos ou esperamos.

A melhor hora para vaguear num centro comercial é entre as 19 e as 20/20.30h. Os da tarde já saíram, os da noite ainda não chegaram… Com a cabeça meio vazia de ideias, por vezes é um bom lugar para, mantendo o corpo em movimento, deixar a mente passear algures nem se sabe bem onde.
Tal foi o caso deste dia em particular.
Parei junto a uma loja de brinquedos. O que esta tem de particular é quase tudo o que vende é em tecido, madeira ou metal. Praticamente nada em plásticos.
Entrei, mais numa de curiosidade que para comprar fosse o que fosse. Mas acabei por ficar com o olhar preso em algo que comprei e uma ideia me assaltou. Perguntei mas não tinham.
Um pião! Faz muito tempo que não vejo um, mais ainda um a rodar e muito mais tempo que não atiro um. Para o solo ou para cima de outro.
Refiro-me aos de madeira, propulsionados por uma corda ou cordel. Apenas para rodar no chão, conseguir pô-lo a rodar na mão ou, bem mais agressivo, no jogo do descasca.
Este, que encontrei noutra loja do mesmo centro, são bem mais suaves, sem o bico afiado que quebrava ou lascava os pobres irmãos onde poderia acertar.

Vinda a hora de jantar, lá fui para onde costumo parar por estas bandas. Sentei-me e após o pedido estereotipado, tentei que ele falasse comigo. A rodar, direito ou invertido, na mão, nas mãos, nos dedos, entre os dedos… Passeei-o e passei-me no tempo em busca de recordações longínquas e das palavras-chave que haveriam de brotar do aparo sobre o papel. A foto ficaria para depois, então se veria o que seria.

A meio da pizza sou interrompido. A chefe de sala, com um sorriso bem simpático a condizer com todo o resto dela e com as suas palavras, veio saber o que estava a fazer aquele cota barbudo ali, sozinho, a bambolear um pião nas mãos e com o olhar bem para além do Bojador.
Lá lhe expliquei, por alto, o que me movia e ao pião. Surpresa!
Aquela Susana, de 25 anos, recordava-se do seu avô (seria bisavô?) que os fazia à mão, com cavilhas de ferro e torneados com a navalha que pendia fundo no bolso de qualquer português. Pelo menos, dizia ela, lá para os lados das caldas, onde crescera.

Ter nas mãos um pião de madeira feito industrialmente num qualquer país da União Europeia, durante um jantar solitário num estabelecimento de uma cadeia internacional, dentro de um centro comercial e encontrar uma jovem descendente de um fabricante artesanal de piões! Não é todos os dias!!!
Não só não é todos os dias como se sobrepôs por completo a qualquer outra coisa que quisesse contar sobre piões.
O mundo gira, gira, gira como um pião.


Texto e imagem: by me

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