A propósito desta fotografia, feita meio a correr ontem com
um telemóvel, entre o local onde jantei e o meu posto de trabalho a que
regressava:
Eu sou do contra!
Quem me conhece sabe que assim é: se todos dizem “assim”, eu
encontrarei argumentos para defender “assado”. Em muitos aspectos da vida,
fotografia incluída.
E se os manuais e os académicos indicam que fotografia deve
ser feita com a fonte de luz principal do lado de cá do assunto, ou nas costas
do fotógrafo, eu prefiro procurar condições para que esteja do lado de lá do
assunto, ou em contra luz. E tenho diversos motivos que me levam a tal, para
além de “ser do contra”.
Por um lado porque um forte contra-luz (ou hair light ou luz
de recorte) permite criar com facilidade distanciamento do assunto em primeiro
plano ao fundo. Mesmo quando não existam elementos que pelo posicionamento,
tamanho e organização (em suma – perspectiva) o permitam.
Por outro lado, e no caso de retrato, se a luz principal
vier do lado de lá do retratado, o seu rosto estará iluminado mais difusamente,
tornando menos evidentes rugas e outros relevos que serão, eventualmente, menos
simpáticos de mostrar. Isto não significa que uma luz “crua” e sombras bem
evidentes e vincadas sejam de evitar sempre. Depende do que me apetece fazer em
função das circunstâncias, do retratado, da relação que tenho com ele ou ela e
do que quero “contar”.
Por outro lado ainda, fotografar é registar a luz que se
reflecte da superfície dos assuntos. Mas eu gosto de ir um pouco mais além e
procurar o que está escondido por essa superfície. Usando uma frase batida, e
no caso de seres humanos, de encontrar a alma do retratado. Se a luz principal
estiver do lado de lá posso, se os assuntos permitirem, ver através deles.
Através do cabelo, através das nervuras de folhas ou pétalas, através das texturas
de tecidos…
Além do mais, e sendo certo que a fotografia é uma
representação bi-dimensional de um universo que vemos a três dimensões com os
nossos dois olhos, necessitamos, como de pão para a boca, de criar a ilusão de
três dimensões numa superfície plana. O normal é usarmos a perspectiva, ou o
tamanho aparente dos assuntos conhecidos, para tal. Igualmente normal é o
definirmos, com a organização dos elementos dentro dos limites da imagem,
linhas reais ou não de criem essa mesma ilusão. Mas também usamos a luz e a sua
ausência – a sombra – para isso. Para nos ajudar a definir tamanhos e linhas
que criem a noção de distância ou volume. Mas tenho por ser-me bem mais fácil
mostrar texturas e volumes se as sombras estiverem para cá do assunto. E,
consequentemente, se a luz principal estiver do lado de lá dos assuntos. Solos,
cascas de árvores, paredes…
Voltando ao início, eu sou “do contra”. E se toda gente
fotografa o pôr-do-sol mostrando-o e às suas cores, criando silhuetas e sombras
profundas para cá, porque a principal fonte de luz está do lado de lá, eu gosto
de fotografar o pôr-do-sol estando de costas para ele. Mostrando os assuntos
quando a luz está mesmo muito baixa, criando ambiências ao receberem a luz
solar bem quente, filtrada pela atmosfera, por vezes contrastando com o céu
que, por estar em oposição ao sol, está azulão forte e criando o tal “ouro
sobre azul” que tanto é elogiado. Além do mais, um bonito e quente sol
escondendo-se numa linha de horizonte (marítimo, campestre ou citadino) é quase
sempre igual em qualquer parte do globo. Mas aquele pináculo de igreja, aquele
depósito de água, aquele rosto ou gesto, iluminados pela última réstia de sol…
marcam um tempo e um lugar inimitável e indelével.
Claro que ser do contra não é fácil. Não é fácil sairmos da
formatação visual e cultural que temos. Não é fácil que consigamos comunicar
visualmente usando códigos não habituais para quem recebe. Não é fácil
encontrarmos as condições que nos satisfaçam, técnicas e estéticas.
Mas se o acto de criar fosse coisa fácil, sem esforço ou
mesmo dor, não teríamos prazer nele.
Eu sou do contra, fotografia incluída. E tenho prazer nisso.
By me
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