sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Orgulhoso ou nem por isso




 Fazemos coisas que queremos e coisas que não queremos.

Destas últimas são, por exemplo, o lavar da loiça, o pagar impostos, o suportar as filas de trânsito.

Não as queremos fazer mas é difícil (só difícil) fugir a elas.

Já das que queremos, pode-se referir tomar banho, amar ou, no meu caso, fotografar.

E se do banho não há motivo para ter orgulho, mas tão só a satisfação posterior, no amar também não há motivos para estarmos orgulhosos, excepto no que toca ao orgulho de sermos amados. Já a fotografia é motivo de orgulho. Aquilo que faço é o resultado do meu esforço, nem sempre bem sucedido, mas sempre de vontade. E conseguir superar-me e ir mais longe hoje que ontem é motivo de orgulho.

Mas há outras coisas que faço porque quero e porque a isso sou obrigado e das quais pouco, se algum, orgulho tenho. Uma delas é o ser cidadão e fazer questão de o ser.

A cidadania não se limita ao acto eleitoral, ao manter as ruas limpas e cumprimentar quem passa. Passa por se ser interventivo, participativo, contestatário e solidário, ter opinião e fazer questão de ser coerente, passa por ser e não apenas estar.

E isto é algo que quero mas também ao qual me sinto obrigado. Não o fazer, mesmo que uns dias de uma forma mais visível e outros bem mais discreto mas não menos frutuosos, é renegar aquilo que sou e aquilo que quero ser. É não fazer aquilo que quero e aquilo a que me sinto obrigado, bem para além de leis e governos.

De ser mais que estar não me orgulho. Sou, ponto final. Tal como sou barrigudo. Sou.

O único orgulho que pode advir deste ser é o constatar resultados disso. Não me orgulho de atravessar a velhinha na rua. Mas orgulho-me que ela possa lá estar. Não me orgulho das aulas que dei, mas tenho um orgulho imenso do sucesso dos alunos. Não me orgulho de levar um sobrinho a uma manifestação, mas fico inchado de o ver a manifestar-se porque percebe e acredita no que diz e faz.

Há quem se orgulhe do carro que tem, do emprego que conseguiu, das férias que fez, da corrida que ganhou. O meu orgulho surge do que me sai das mãos, tendo por único adversário eu mesmo e os meus próprios limites.

O resto é porque quero e porque me sinto obrigado a isso.


By me

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