Tenho vindo a afirmar, ao longo dos tempos, que fazer
ou ter uma fotografia é o resultado de um sentimento de cobiça ou desejo de
pose. Por aquilo que nela está iconoficado: o pôr-do-sol, a pessoa, o objecto.
Apenas para dar um exemplo que consubstancia esta
afirmação, quantos serão os que fotografam e exibem objectos que possuem? Com
que lidam todos os dias? A excepção será, talvez, quando a fotografia e a sua
exibição sirva para demonstrar que se possui o retratado – pessoa ou objecto.
E quanto mais precioso é o iconografado mais
sacramentalmente se guarda a imagem: álbuns especiais para aquelas férias ou
casamento, molduras caras para este ou aquele retrato de um parente ou amado e,
cereja no topo do bolo, a carteira onde constam as fotografias de parentes, em
regra muito queridos, vivos ou não. Ou, nos tempos que correm, um telemovel
onde a luminiscência do ecrã substitui o plástico das carteiras. E, quando se
fala nos filhos, netos, namorado/a ou pais, aí está o arquivo de bolso onde se
encontram as fotografias mais recentes ou significativas.
Mas a fotografia também é uma manifestação de afectos
negativos! Fotografa-se o acidente, o insólito, o feio, o incómodo!
E, aqui, há dois tipos de motivos: Ou o exaltar o
fotógrafo, mostrando assim com a fotografia, que ele esteve no local, que testemunhou
aquela situação ou, menos frequente mas real, como forma de exorcismo do mal
retratado, tentando assim que o iconoficado não passe disso e não seja parte
integrante da vida do fotógrafo ou exibidor.
Um pouco como sucede com as anedotas, de que tanto nos
rimos, e que, se bem as analisarmos, nunca falam de coisas agradáveis ou boas
que tenham sucedido aos intervenientes. Pelo contrário, rimo-nos com o mal dos
outros como se, com o riso, pudessemos afastar a possibilidade de o mesmo nos
acontecer.
Mas há ainda uma terceira atitude negativa que é tida
perante a fotografia. Neste caso, não perante o acto de a fazer mas antes para
com ela enquanto objecto ou ícone: a negação ou destruição!
O rasgar, queimar, destruir de uma fotografia é uma
forma de remover o que nela consta ou conta das vidas de quem assim age. Uma
forma de negar o passado ou tentar, com isso, impedir que este se repita ou
continue.
Exemplo mais ou menos corriqueiro é o que sucede
aquando de uma zanga entre namorados ou quebra de votos de afectos. As
fotografias do “outro” são destruídas, na tristeza do privado ou na raiva do
público.
Acontece mesmo ser o retratado a exigir a devolução de
fotografias que o “outro” possui de si, impedindo que o mesmo “outro” possua o
que quer que seja de quem protesta ou reclama. Nem mesmo a sua imagem!
O gesto supremo, então, é a adulteração da fotografia,
rasgando-a e destruindo apenas a metade em que se vê o “outro”, como que um
afirmar que se continua por cá, vivendo, mas que o “outro” já não faz parte dessa
vida.
Refira-se, também, nesta relação de afectos negativos
para com a fotografia, a adulteração bem mais sofisticada da imagem que foi o
caso (quem sabe se ainda é?) do apagar em fotografias a presença de gente
caídas em desgraça perante o regime. Como sucedeu, por diversas vezes, na União
Soviética ou na Alamenha Nazi, para citar apenas casos públicos e notórios.
É assim que se constata que a relação com a fotografia
(ou com a imagem no seu todo) é uma relação de afectos, de desejos de pose ou
de repúdio, como os agora descritos.
E você? Já destruiu alguma fotografia?
By me
Sem comentários:
Enviar um comentário