sábado, 23 de novembro de 2024

O bolo




Este é um bolo da minha infância.

Fazia-nos abrir os olhos, quais faróis de nevoeiro, quando os víamos no expositor do café de bairro ou na padaria, de permeio com arrufadas ou pães de leite.

Os orçamentos familiares eram magros pelo que, em acontecendo comer-se um, era dia de festa. O chocolate, o creme branco e a cereja ver-me-lha no topo do bolo faziam uma combinação perfeita. O difícil, mas difícil mesmo, era comer o bolo à mão e conseguir deixar creme e cereja – o melhor – para o fim.

Dizia-se que era um bolo de pobres, já que o recheio era composto de restos de outros bolos. Coisa que só poderia afectar os ricos, já que em casa comer os restos da refeição anterior sempre foi o habitual. E ainda o é, nos dias que correm.

Mas o que esta imagem se me sugere é de outro cariz. Fotografia.

Qualquer um que se dedique um pouco mais a sério ao acto fotográfico sabe que, para além do assunto principal, haverá que considerar a luz, que molda volumes e distâncias, o circundante ao assunto principal e a relação entre entre ambos.

Quem quer que se “entretenha” a criar assuntos para fotografar sabe também que, se a luz é “domável” e a perspectiva é opção nossa, o circundante é o mais difícil de controlar.

Ou bem que se possui um bom armário ou armazém de fundos e objectos que ajudem a “compor o ramalhete” ou bem que haverá que improvisar com o disponível um ambiente que, de algum modo, seja consentâneo com o assunto e com os sentimentos que queremos transmitir. Nem sempre é fácil, convenhamos.

Em contra-partida o pintor não tem esta dificulade. Confrontado com um assunto principal, que quererá que seja fiel na tela, pode inventar todo um terceiro plano, objectos circundantes ou mesmo um primeiro plano. Até, em o querendo, nada colocar atrás ou ao lado do assunto principal, deixando-o a “flutuar” na tela virgem e branca.

Por mim, que não sou pintor, que não tenho um armazém nem domino as IA da actualidade, remeto-me ao que encontro aqui por casa. Mas não deixo de vadiar pelas feiras de rua com velharias e bric-à-brac solto, bem como pelas lojas de inutilidades ou de tecidos. Há sempre este ou aquele objecto que pode ser útil como fundo ou complemento.

Em não tendo outra opção... Bem, “Com um fundo preto nunca me comprometo”.

 

Pentax K1 mkII, Tamron SP Adaptall2 90mm 1:2,5


By me

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