sexta-feira, 30 de novembro de 2012
Tangentes e secantes
Data: quinze de
Agosto de mil novecentos e oitenta e tal.
Como a fixei? Por
ser feriado e essa ser a pedra de toque para todo o episódio.
Era eu
administrador do prédio onde residia. E este estava em obras. Havia que
aumentar o declive do telhado, devido a infiltrações de águas da chuva. Nem uma
telha havia lá em cima nesse dia!
Pouco depois do
almoço, tocou a campainha: era o técnico de TV que ia reparar o sistema de
distribuição colectivo do prédio.
No fim do
trabalho, umas duas horas mais tarde, regressamos a minha casa para que lhe
pagasse. Grande bronca! Tinha deixado as chaves de casa… dentro de casa. Pela
primeira vez na vida!
Vivendo sozinho, a
coisa torna-se complicada. Para ajudar à festa, quem tinha uma chave de reserva
de minha casa… estava de férias para fora!
Contactada a única
empresa de Lisboa e arredores que estava aberta no feriado e que me poderia
resolver a questão, disseram-me que tinham apenas um piquete para toda a zona e
que não sabiam quando ou se poderiam atender o meu pedido.
Os bombeiros cá da
zona informaram-me que com a escada de “pescoço de cavalo” não faziam o
trabalho e que a escada “Magirus” do conselho estava avariada. Em caso de
emergência, chamavam a de Lisboa.
De Lisboa ouvi uma
gargalhada perante o meu pedido.
E a minha
paciência a descer perigosamente para muito perto da linha de água.
Foi então que
chegaram os operários que faziam as reparações do telhado. Confrontados com a
minha pilha de nervos, propuseram-se resolver a coisa. E resolveram!
Quatro homens, eu
incluído, agarraram as duas pontas de uma corda bem forte, no telhado. Um
quinto, amarrado no meio dela, desceu pela fachada, entrou em minha casa pela
janela e abriu-me finalmente a porta.
Não seria o filho
de minha mãe que faria aquela viagem de uns 10 metros de descida controlada mas
de uns 30 metros de queda livre! Mas fiquei-lhes francamente agradecido.
No meio desta
história de final feliz, um factor me entristeceu:
Sendo feriado e
estando bom tempo, bastantes eram as pessoas que estavam por ali na rua. Mas nem
uma só estranhou que um desconhecido descesse por uma fachada e entrasse num
apartamento pela janela. Sem que estivesse visível o locatário!
Nem deram o
alarme, nem chamaram a guarda nem mesmo lá foram saber da legitimidade da
manobra. Se se tratasse de um assalto, talvez me deixassem o telefone para me
poder queixar!
Ser cidadão passa
por intervir na vida do colectivo. Numa tangente ou mesmo numa secante!
By me
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
"Embuste"
Eis
uma palavra que já não ouvia há muito.
Demasiado
delicada, palaciana, para descrever o que alguns “senhores” fizeram e fazem no
país.
Na
mesma linha de retórica, talvez que lhes façam falta alguns correctivos
aplicados a preceito.
By me
Rotinas
Tem-me acontecido
neste último ano ter com muita frequência o mesmo horário.
Sei que para a
maioria das pessoas isso é o habitual: horas certas para começar a trabalhar,
horas certas para deixar de trabalhar.
Acontece, porém,
que no meu tipo de actividade profissional isso é particularmente raro. Cada
dia um horário de trabalho ou, na pior das hipóteses, horários mais ou menos
certos uma semana seguida.
Tantos dias num
mesmo ano (mais de dois treços) com o mesmo horário e, ainda por cima, muito
semelhante com o comum dos meus concidadãos é algo de insólito. Pelo menos para
mim.
Mas, mais que insólito,
é-me desagradável. Essa rotina de todos os dias acordar à mesma hora, sair de
casa à mesma hora, apanhar o mesmo comboio à mesma hora, eventualmente usar a
mesma porta de acesso e sentar no mesmo banco… todos os dias?!!!!!
É realmente demais
para mim e provoca-me um sério desconforto.
Acontece que
nestas rotinas a que sou obrigado a submeter-me acabo por ir conhecendo de
vista os mesmos passageiros, às mesmas horas, entrando pela mesma porta na
composição, sentando-se nos mesmos bancos, lendo o mesmo jornal ou revista… Tão
mau para mim quanto o viver esta rotina é constatar que ela parece ser normal e
confortável para tantos que, comigo, diariamente migram do bairro suburbano
para a grande cidade.
De entre estes “conhecidos-de-vista”
sobressai-me uma senhora e uma garota. Aparentemente mãe e filha, a primeira na
casa dos quarenta, a segunda rondando os treze/catorze anos. E, de tantas vezes
as tenho visto, à mesma hora, no mesmo ponto do cais de embarque, entrando p’la
mesma porta, sentando-se no mesmo banco, que já lhes conheço os tiques, eu próprio
imbuído já desta terrível rotina.
Mas, mais que a
minha própria rotina desagradável, dói-me ver a garota. Tem um ar triste. Todos
os dias tem um ar triste, muito triste. A sua rotina diária é ter um ar triste.
Que nunca a vi sorrir, pese embora a enormidade de vezes que já a vi mais a mãe.
Mas entendo a sua
tristeza. Muito bem.
Todos os dias, à
mesma hora, embarcar no mesmo comboio, sentar no mesmo banco, sair na mesma
estação, tendo a mesma companhia… também eu, se tivesse a sua idade, teria um
ar profundamente triste, todos os dias.
Pois se hoje, com
esta minha idade, me entristece esta rotina de todos os dias, à mesma hora, …
Um dia, quem sabe,
ofereço-lhe qualquer coisa, ou peço-lhe para deixar que lhe faça uma
fotografia, ou conto-lhe uma anedota, ou provoco-lhe um sorriso, ou… o que quer
que seja que lhe quebre, e a mim, esta rotina de todos os dias, à mesma hora,
apanhar o…
Morrer de tédio p’la
rotina será terrível. Morrer de tédio p’la rotina nessa idade é uma catástrofe!
By me
Acredito
que o que por estes tempos se está a passar em Portugal, mais que “o desígnio
dos deuses” é a vingança dos deuses.
Que
este país teve invasões de toda a ordem, cataclismos terríveis, ditadores
absolutos… e sobreviveu.
Esta
situação é, por aquilo que deduzo, a última intervenção divina usando técnicas
locais.
É
presumível que sobrevivamos, considerando a já proverbial mansidão lusa, ainda
recentemente de novo comentada nas esferas internacionais.
Restará
depois a técnica definitiva e bem mais radical: o afundanço real do país no
oceano, qual Atlântida, com o consequente suspiro de alívio divino, fruto da
sensação do dever cumprido.
Portanto,
e se te queres safar, trata de ir enchendo as garrafas e verificar o zebro!
Ou
então enfrentares os deuses, olhos nos olhos, e dizeres-lhe que quem manda aqui
somos nós e que vamos acabar já, rápido e curto, com mais esta maldição.
By me
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Mudanças de rumo
Porque
é que chegámos ao ponto em que chegámos, tanto na questão económica quanto no
que respeita ao respeito que as instituições governamentais têm pelos cidadãos?
Fácil!
Porque,
ao longo dos tempos, temos passado carta branca a entidades privadas (partidos)
para que, supostamente em nosso nome, decidam por nós.
E,
ao passarmos essa carta branca, não apenas nos desligamos da gestão do país,
como autorizamos que as decisões sejam tomadas e executadas à revelia da
vontade do povo. O tal povo que lhes deu carta branca.
Quando
os representantes do povo não deverem mais obediência ao seu partido que a quem
os elegeu;
Quando
dos cidadãos realmente se interessarem pelos actos que os seus representantes vão
fazendo, fiscalizando-os e questionando-os directamente e não apenas e
ficticiamente de quatro em quatro anos;
Quando
os eleitos possam ser responsabilizados pela lei por má gestão da coisa pública…
Nesse
dia não estaremos no fundo de um buraco com políticos a olhar para nós mas no
rebordo do buraco a olhar para o fundo.
Até
lá, até a democracia estar – de facto – nas mãos do povo, teremos que a tomar
nas mãos e pensarmos que leis e decisões que não reflectem a vontade soberana
do povo são más leis. E que, como tal, para além de terem que ser alteradas, não
lhes devemos obediência.
By me
Praga/Lisboa
É
um livro interessante, este que aqui tenho.
Chamando-se
“A Praga de Franz Kafka”, trata-se de uma “viagem” pela cidade da Praga, onde
viveu Kafka.
Descreve-nos
os locais por onde passava, os cafés que frequentava, as casas em que viveu e
até os eléctricos que usava.
Comprei-o
faz tempo numa livraria que já não existe, numa pequena terra portuguesa.
Mas
confesso que o livro que gostaria mesmo deter lido teria o título “A Lisboa de
Franz Kafka”.
Significaria
isto que ele teria vivido por cá. Que escreveria ele, no seu tempo, sobre
terras Lusas e os seus costumes?
Agora
o que me levaria ao céu da literatura seria ler o que sairia do seu génio se
vivesse hoje e cá.
Provavelmente
não morreria do coração nem de tuberculose, mas antes se suicidaria confrontado
com o manancial para os seus livros.
By me
Quando eu morrer
Quando eu morrer,
por favor atirem-me para uma vala comum.
Que de nada
valerei então mas quero continuar a ser igualitário mesmo depois do fim.
Do que tiver sido
e deixado, que se divida em dois grupos: o que se não aproveita e o que sobrar.
De ambos que se tirem
ilações: do primeiro e maior que se aprenda o que não fazer; do outro, se
alguma coisa contiver, que se use para que os vindouros possam ir mais longe,
onde eu mesmo não consegui ir.
Que a jornada é
longa, tão longa enquanto houver um humano por cá.
By me
Grandes e pequenos
Certas
conversas ou temas cedo me levam a transforma-las em discussões, acesas e
incisivas. Outras vezes, os mesmos temas pouco mais fazem com que eu abandone a
argumentação ou mesmo o local, na inutilidade de esgrimir ideias com certas
mentes.
Um
desses temas é a frase batida “Os sindicatos não prestam!”
Quem
assim argumenta, define um sindicato como uma entidade abstracta e autónoma,
com vida própria e quiçá personalizada nos seus dirigentes.
Mas
aquilo que se esquece quem assim protesta, é que um sindicato mais não é que
uma associação de pessoas (as mais das vezes assalariados) que os representa. E
que os seus dirigentes são fruto de eleição ou contratação, consoante o país e
as suas regras. E que a força de um sindicato é tanto maior ou menor quanto a
força que os seus associados lhe derem!
O
mesmo se passa com um país. Funciona bem ou mal em conformidade com as atitudes
dos seus naturais.
Supondo
que se trata de uma democracia (e mesmo que não o seja) os seus governantes
são-no porque de alguma forma foram escolhidos e/ou tolerados pelos cidadãos.
As decisões e linhas de rumo tomadas pelas cúpulas de um país reflectem, de
alguma forma, a maneira de pensar e actuar dos seus eleitores.
Dizer
que este ou aquele governante não presta ou que o povo é bera, é uma forma de
alijar as responsabilidades que cabem a cada um dos que nele habitam. É passar
o ónus da culpa para uma entidade abstracta, dando a entender que quem faz
essas afirmações não apenas não é responsável pelo resultado das escolhas do
colectivo como ainda que está à parte do povo, não fazendo parte dele.
Na
actual fraseologia política, caiu em desuso a expressão “luta de classes” ou a
relação “esquerda/direita”.
Fala-se
em esquerda moderna, em liberalismo ou neo-liberalismo, em objectivos
tendenciais e competitividade.
O
conceito de “patronato” e “proletariado”, “classe dominante” e “classe
dominada” são hoje “politicamente incorrectos” e poucos são os que os usam.
Em
troca nasceram a “sociedade civil”, a “classe política”, os “pequenos
empresários”, os “trabalhadores por conta de outrem”, as “famílias”…
Mas,
na prática, o que mudou foi apenas a nomenclatura.
Continua
a existir quem queira mandar e mande e quem seja mandado e isso o permita! Os
“grandes” continuam a sê-lo e os “pequenos” são-no cada vez mais.
Mas
uma coisa é certa: os grandes só são grandes enquanto os demais estiverem de
joelhos.
É
que, quando mortos, vamos todos deitados e com a mesma altura.
Imagem:
“Nazaré, Portugal”, by Peter Fink, 1954
terça-feira, 27 de novembro de 2012
Um pequeno exercício
Façamos
um pequeno exercício que, pela sua impossibilidade, não passa disso mesmo - um
exercício de imaginação:
Supúnhamos
que, por um qualquer motivo, durante cinquenta anos apenas uma meia centena de
pessoas frequentava por ano o ensino superior ou profissional em Portugal. E
imaginemos também, para reforçar o exercício, que todos tinham excelente
aproveitamento.
Passado
este meio século, teríamos uma sociedade de “incultos”, de gente que não
saberia trabalhar com os equipamentos que hoje existem que não fosse pelo
hábito, teríamos médicos, engenheiros de diversas áreas, especialistas de tudo
em final de vida.
Teríamos
também duzentos e cinquenta pessoas altamente qualificadas que, por serem tão
poucas e considerando o sistema de procura e oferta, se fariam pagar a peso de
ouro, aplicando os seus saberes às elites endinheiradas, ficando todos os
restantes sem canos, medicamentos, diagnósticos, motores, sistemas eléctricos,
casas, trigo, bifes e tudo o mais que hoje usamos e de que queremos mais e
melhor.
Deste
exercício de imaginação se pode concluir com facilidade que o sistema
ensino-aprendizagem é vital para a sociedade. E que, como tal, deveria ser
realmente gratuito, fosse qual fosse o grau de qualificação que se
considerasse. E não o mero “tendencial” que a lei prescreve! Dando oportunidade
a que, quem tenha capacidades para ir longe no saber e no fazer o possa sem que
isso seja um exercício de economia familiar. Trata-se de um investimento que a
sociedade faz hoje para colher no futuro. Não tão distante quanto isso!
E,
já agora também, considere-se que o que a imagem ilustra não pode ser a
realidade. Nem o seu inverso! Nem os alunos são burros e os professores
déspotas, nem os jovens os reis e senhores e os mestres os elos mais fracos.
Neste
jogo de “aprender e ajudar a aprender”, cada qual tem o seu lugar e igual
importância. E se ambas as partes de tal estiverem cientes e não se tratarem
como adversários numa arena de mesas e cadeiras, todo o trabalho acontece com
muito mais facilidade e resultados positivos.
Que
é o que ambos querem e a sociedade deseja!
By me
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
Antes de tempo
Dezembro
está à porta e, com ele, tudo o que se liga com o Natal:
Religiosidade,
tradição, paz na terra aos homens de boa vontade etc.
Assim,
decidi alinhar naquilo que grande parte dos meus concidadãos alinham: espírito
natalício. Com a pequeníssima diferença que tentarei ser politicamente correcto.
Assim,
e para estar de acordo com o que Sua Santidade o Papa veio agora dizer, no meu
presépio não há nem vaquinhas nem burrinhos. Só uma ovelhinha que, ao que
parece, não se sabe se estaria ou não.
Também
para estar de acordo com a Santa Sé, mostro-o ainda antes de Dezembro. Parece
que não há grande rigor no que diz respeito a datas (ano e dia), pelo que o meu
vai já para que não digam que guardo tudo para a última hora.
Muito
naturalmente, o meu presépio é pequenino. Estamos em época difícil, em que a
ostentação e os luxos têm que ser deixados de fora. Não há dinheiro para
gastar, não há presépios grandes!
Por
fim, apresento-o de mão estendida. É o que eu vou fazendo, é o que muitos vão
fazendo, mesmo que não em sentido figurado, é o que este país está todo a
fazer: de mão estendida à caridade de quem passa ou de quem queira aproveitar
para fazer a sua boa-acção do ano.
Depois
desta chalaça toda, seria ocasião para mais uma: “Se é Natal quando um homem
quiser, posso abrir já as minhas prendas?”
Pois
não a vou usar, que este ano de prendas estamos mal, tanto eu mesmo quanto
todos aqueles com quem as costumo trocar.
By me
'Tá na mão!
Não é por responder
ao nome a que respondo, mas…
… o que é certo é
que tenho o mundo na mão!
Assim lhe pudesse
dar o destino que merece…
By me
Atravessando os tempos
Corriam
os anos 70 e as edições ITAU vendiam que nem pãezinhos. Cartazes, postais,
panfletos, marcadores de livros, tudo quanto pudesse ser interventivo ou no
campo do sonho e da paz eles tinham.
Por
essa altura comprei este “poster”.
Colado
numa placa de aglomerado de madeira, esteve sempre em frente dos meus olhos, enquanto
estudante do liceu e enquanto estudante da vida, pendurado num pedaço de parede
livre de estantes e fotografias.
Nas
voltas que a vida deu, também ele – o poster – andou aos trambolhões, com
marcas nos cantos de algumas pancadas menos simpáticas. Tal como eu mesmo.
Mas
se as fotografias que faço vão e voltam, de acordo com as disposições e as épocas
do ano, este é imutável, não aceitando eu que o seu espaço seja poluído por
outras mensagens ou diatribes que vá fazendo.
Que
há verdades e sentimentos que nos ultrapassam.
Acrescente-se
que, por aquilo que consegui saber, a frase/poema “O amor é um pássaro verde,
num campo azul, no alto da madrugada” terá sido escrito por Vítor Barroca
Moreira, com nove anos de idade.
By me
domingo, 25 de novembro de 2012
Acordem porra!
É sintomático
vermos como agora os media recorrem a antigos líderes do país (presidentes,
ministros, sindicalistas, dirigentes partidários) para se pronunciarem sobre o
actual estado de Portugal.
Não se trata
apenas de os “usar” para passar recados. Vai muito mais além que isso!
Eu diria que é a
consequência de a actual geração entre os trinta e os cinquenta anos de idade não
ter gente capaz de fazer frente ao que nos está a acontecer. Nem em actos nem
em ideias.
Como diria um
primo alentejano (se o tivesse): “Acordem, porra!”
By me
Regras e afectos
Fico assustado
quando vejo “profissionais” da imagem, estática ou animada, a levarem ao
extremo a aplicação da “regra dos terços”.
Se as regras
fossem para serem aplicadas assim, com rigor, no fazer de imagem, todos aqueles
que fazem disso ofício estariam sem trabalho e, pior que isso, sem emprego. Que
bastaria um qualquer algoritmo e alguma tecnologia para os substituir.
O equilíbrio entre
os centros de interesse, as manchas de luz, sombra e cor, as linhas por elas
criadas, as perspectivas, os sentidos de leitura, a profundidade do espaço, a
harmonia de tudo isso com a nossa própria cultura e forma de interpretar aquilo
que vemos e fazemos…
Se tudo isto fosse
passível de ser objecto de regras e matemáticas, julgadas por juízes imparciais
e infalíveis…
A arte não
existiria, a vida seria uma sucessão de linhas e planos de projecção e os
afectos, esses, seriam aplicados de acordo com os tomos escritos p’los lentes e
sabedores.
Por mim, quero
quebrar as regras, mesmo aquelas que eu mesmo concebo. E fico enfadado, de um
tédio mortal, quando vejo profissionais aterem-se a regras como lapas na rocha.
Pobres diabos,
incapazes de amar para além da família!
By me
Sofistas
A propósito de uma
conversa de hoje
Os antigos
Sofistas tinham por doutrina que todo e qualquer argumento pode ser refutado
por outro e que a efectividade de um dado argumento residia na sua aparência de
verdadeiro, mesmo que o não fosse.
Aprendi isto na
escola, algures no século passado, e fui agora confirmar.
É que eu “adoro”
Sofistas. Particularmente os contemporâneos.
Aqueles que hoje
defendem algo e amanhã exactamente o seu oposto com o mesmo entusiasmo.
O problema põe-se,
não ao nível do prazer intelectual que tal exercício pode proporcionar (e
proporciona) mas tão só em a mudança de pontos de vista depender em exclusivo da
conveniência do momento.
Temos lamentáveis exemplos
no campo da política, da economia, do partidarismo. Mas também, e igualmente lamentável,
no campo laboral.
O cúmulo do lamentável é quando o constatamos em quem menos esperamos.
Um destes dias
passo a adoptar esta atitude em público.
Claro que terei
que encontrar um caixote de lixo onde possa jogar fora as minhas próprias opiniões
e, o pior, a minha própria coerência intelectual.
Mas pondo isso de
parte, talvez seja um exercício divertido.
By me
sábado, 24 de novembro de 2012
Liberdade:
Ser acordado às
seis e meia da manhã, depois de uma semana de noites particularmente curtas,
dizendo:
“Boa! Vou ter
tempo para fazer aquilo que quero!”
E poder dizer isto
sabendo que se poderia virar para o outro lado e ficar umas três horitas mais na
cama, que o corpo o pede.
Liberdade é
gerirmo-nos como queremos e não ao sabor de ditames externos que nos criam a
ilusão de o querermos.
By me
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
Dúvida atroz
Tal como a estória
do ovo e a conversa sobre a garrafa, também aqui tenho uma dúvida atroz:
São covas ou
elevações?
By me
O primeiro
Este é o primeiro.
Apesar disso, prometo tentar não encher este espaço virtual com imagens de
todos quantos encontrar. Acho que nem eu mesmo aguentaria a tortura de tantos
fotografar.
Sim, porque
acredito que iremos ver muitos, muitos mesmo, nas janelas deste país por estes
tempos.
É que se o tolo do
Tuga acha que aquilo que lhe está a ser feito, em seu nome e com o que é
propriedade pública (saúde, educação, finanças, justiça, impostos, etc.)
melhorará Portugal, também deve acreditar que o Pai Natal existe e tê-lo na
janela poderá ser um bom chamariz.
Claro está que
acontecerá com Portugal o mesmo que com a visita do velhote simpático e muitas
serão as frustrações.
Mas, também, o que
se pode esperar que aconteça a quem acredita no Pai Natal e idade para votar?
By me
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Escritas e leituras
É assim como que
uma mania que temos, os humanos:
Folhas são as dos
livros e as linhas têm que ser compostas de caracteres por nós inventados.
Soubéssemos ler as
linhas que o mundo vegetal escreve e quão mais ricos seríamos!
By me
Esplanada multi-racial
Num quiosque de um
dos pequenos mas simpáticos jardins de Lisboa, encontramos isto:
No chão, ao lado
do balcão, uma tigela metálica com água. A meia altura um cartaz/aviso.
Para os que
tiverem dificuldade em ler, devido à perspectiva forçada, aqui vos deixo o
conteúdo:
“Hoje especial
Serviço primoroso
também para os estimados animais
Servimos o seu
melhor amigo
Apoio Câmara
Municipal de Lisboa”
Saiba-se que este
jardim, com o seu quiosque, se situa numa zona residencial com uma média etária
elevada e que muitos são os que possuem cães que ali os devem levar a passear.
Publicidade
simpática, sem dúvida. Que poderá incentivar os acompanhantes dos animais a ali
fazerem uma pausa e, já agora, tomarem um cafezinho e um bolito(é bom o café,
aqui).
Agora chamem-se de
egoísta, se quiserem. Mas certo é que não direi o nome do jardim, nem a sua
localização.
É que conheço o
espaço há quarenta e tal anos, muito antes, mas muito antes mesmo de o baldio e
terreno para carros ser tão agradavelmente adaptado a ser alegremente vivido.
E sendo certo que
ainda não consegui, por falta de tempo, por não me ficar nas rotas habituais ou
por falta de inspiração, fazer uma cobertura fotográfica decente do local como é
agora, gostava de o conseguir fazer antes de aqui incentivar a sua “invasão”
justificada.
Mas farei o possível
para que este quiosque, e a sua esplanada, tenha alguns visitantes extra num
Domingo e em breve, assim o São Pedro ajude.
By me
Alerta
Entrou ontem em
vigor, aqui na vizinha Espanha, uma nova lei. De acordo com o que pude saber,
destina-se a combater a fuga ao fisco.
Determina ela que
todas as transacções de valor superior a 2.500 euros deixarão de poder ser
efectuadas em dinheiro vivo, passando a ser obrigatório o uso de cheques,
transferências bancárias, cartão de débito ou cartão de crédito.
Os infractores
incorrerão numa multa percentual ao valor da infracção, sendo que se um deles
denunciar a situação, num prazo de 3 meses, ficará isento da multa, recaindo a
sua totalidade sobre o outro, não importando quem é o vendedor ou o comprador.
Dir-me-ão, talvez,
que esta medida em pouco nos afecta, já que é para lá da fronteira. Não penso
assim, já que nestas coisas basta que alguém tenha uma ideia com os contornos
que a seguir descreverei para que logo outros - ou muitos outros - sigam as
pegadas. E em breve, suspeito, por cá haverá algo de parecido.
Dir-me-ão também
que isto é de pouco importância. Afinal, que mal tem? 2.500 euros é muito
dinheiro e a grande maioria dos Portugueses (talvez que também Espanhóis) nunca
viram ou verão tanto dinheiro em notas e moedas. Verdade. Para muitos, este
valor corresponde a meio ano de salário, alguns quase um ano inteiro de
rendimentos. Donde, poucas serão as transacções envolvendo cidadãos na sua
condição de contribuintes singulares que atinjam tal montante.
A questão, do meu
ponto de vista, não é “montantes” mas antes “princípios”!
Porque é que para haver
um negócio entre duas entidades, individuais, empresariais ou o que quer que
seja, tem que estar envolvida uma terceira entidade, particular, de seu nome “banco”?
Porque é que tenho
que ter conta bancária?
Porque é que tenho
que pagar a uma entidade particular pelo simples facto de possuir dinheiro?
Os bancos são negócios
particulares cujo objectivo é ganhar dinheiro com o dinheiro dos outros. Não
quero pôr em causa a sua utilidade na sociedade actual. Entendo que estarão
eles na raiz da grande maioria dos sérios problemas dos últimos dois séculos,
mas essa é outra discussão.
A questão
primordial é: porque é que o estado (todos nós) me pode obrigar a negociar com
alguém, dando-lhe lucro? Queira-o eu ou não!
Não creio que esta
obrigatoriedade se enquadre numa sociedade dita democrática e de direito.
Claro que se pode
argumentar que as actuais democracias de direito e ocidentais não o são de
facto. Trata-se antes de ditaduras em que o poder não é definido através de
eleições, como geralmente se supõe, mas antes através da circulação de dinheiro,
gerido por entidades sem cara ou nome.
Mas será que nos
podem obrigar a envolver terceiros nas nossas vidas privadas?
Fica o aviso do
que, em breve, pode acontecer por cá;
Fica o alerta
sobre os conceitos que temos por certos e que, eventualmente, estão errados;
E fica a sugestão
para que se pense no assunto, pelo menos até que se volte a ser chamado a votar
em alguém: fará sentido votar sempre nos mesmos - ou mesmo abster-se - ou fará
sentido votar em quem não defenda uma sociedade totalitária, mesmo que gerida
por bancos?
By me
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
Agora
Estivesse o Sol
acima do horizonte, e eu vos diria a que horas vou para a cama esta noite.
Mas como o que
está lá em cima é a Lua, e esta é bastante incerta nestas coisas de contar o
tempo pela luz e posição, este relógio de Sol de bolso de pouco serve.
Basta assim que
saibam que vou agora, que é um momento bem preciso na cronologia.
By me
terça-feira, 20 de novembro de 2012
Raismapartam!
Lá em cima, um céu
cinzento, pesado, a ameaçar uma chuvada já prevista.
Cá em baixo, de um
lado uma garbosa estação de caminho de ferro, já quase ícone citadino. Do outro
um centro comercial, já engalanado para atrair, quais borboletas em torno da
lâmpada, o incautos que irão comprar inutilidades porque é a época delas.
Entre uma e outra,
a velhinha, quase com idade para ser minha avó, continua a pedir. Mal se
percebe o que diz, para alem de “comer”, mas o olhar com que me olhou e a forma
como me segurou as mãos não deixavam mentir.
Ia eu gastar numa
bica o preço de ocupar uma mesa para escrever. Não me apeteceu. O que trazia na
cabeça desapareceu, como que por magia, com o olhar dela.
Pensei em
regressar e pedir-lhe para fazer uma fotografia. Mas, raismapartam se o fiz!
Que não sei se
teria coragem para tal futilidade. Mas também porque a velhinha já lá não
estava.
Uma urbana
carrinha da PSP surgiu entretanto e devem tê-la ou enxotado ou assustado, que
desapareceu. Não fica bem aquela figura em frente a um templo do consumismo.
Mesmo que pouco haja para gastar!
Raios nos partam a
todos, que deixamos que o fim de uma vida seja assim!
By me
Nós
A vantagem – ou
desvantagem – de já se ter vivido um pedacito é já ter um bom número de
histórias – ou estórias – contáveis.
Nem todas
dignificantes para quem as conta, nem todas dignificantes para o protagonista
do que é contado.
Calhou-me, em
catraio na escola então primária, agora primeiro ciclo, dois irmãos como
colegas. Mais tarde, e porque a zona de residência na cidade continuava
próxima, acabámos por partilhar o mesmo liceu.
Esses dois, com
diferença de um ano e pouco entre eles, eram peças especiais. Para que se tenha
uma ideia, quando se zangavam com alguém, arregimentavam mais uns quantos que
segurariam na vítima, enquanto eles se entretinham a dar uso ao cinto que lhes
segurava os calções, primeiro, as calças mais tarde. Isto desde os primeiros anos
de escola.
Já no liceu, tive
com o mais novo uma verdadeira cena de pugilato, das raras que vivi, e da qual
ainda guardo uma cicatriz na mão direita, de lhe ter acertado bem em cheio.
Por esses tempos
(’72, ’73, ’74) soube-os ligados a um tal de “MN”, Movimento Nacionalista,
coisa pouco simpática e do outro lado da barricada que eu defendia, que andava
a escrever e distribuir, na clandestinidade possível, panfletos contra a guerra
colonial.
No ano lectivo
1974/75, em que já não partilhámos liceu por via das moradas de residência,
soube que tinham sido por várias vezes detidos pelos militares, algumas no
liceu, outras em casa, por suspeita de pertencerem ao ELP – Exército de
Libertação Português – um movimento de extrema-direita, que pretendia repor pelas
armas o regime deposto com a revolução.
Passou o tempo e
pedi-lhes o rasto. A um e a outro. E, com ele, a lembrança sequer que tinham
existido. Até um destes dias!
O nome ouvido no
noticiário televisivo fez-me levantar as orelhas. As imagens que se lhe seguiram,
dando o desconto de quarenta anos vividos de parte a parte, fez-me recuar no
tempo. E uma busca na web tirou-me mesmo quaisquer dúvidas residuais.
Aquele fulano na
pantalha e que se candidatava numas eleições que não para um cargo público era
mesmo aquele com quem me bati, que recorria a outros para os seus trabalhinhos
sujos e que, mais velho fosse uns anos, teria sido agente da PIDE p’la certa.
Ficou-me, para
além da raiva sobre o passado, uma dúvida: deveria eu “por a boca no trombone”
e divulgar o que sobre ele sei?
Em público seria
complicado, que duvido que os militares tenham registos desses tempos
conturbados. E, quanto ao resto, seria “palavra contra palavra”, em que a sua
alta posição social me derrubaria p’la certa.
Fiquei-me por
fazer uns desabafos junto de alguns conhecidos, escolhidos. Do que daí advier,
com ou sem investigações por parte dos seus oponentes, passar-me-á
completamente ao lado.
Quanto a ele,
certamente que, mais cedo ou mais tarde, terá que desatar os nós que deu na vida
como qualquer outro. Eu mesmo incluído.
By me
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
Pain in the...
Custa-me pensar
que amanhã farei o mesmo caminho, na mesma hora, cruzarei as mesmas portas,
cumprimentarei as mesmas pessoas (gostando ou não delas), sentar-me-ei na mesma
cadeira para carregar nas mesmas teclas e botões, colaborando nas mesmas
mentiras, embustes e vigarices.
By me
Gosto do meu bairro, caramba!
Era preto. Nem
muito nem pouco, apenas preto. Tal como o gorro que trazia na cabeça não estava
nem muito nem pouco enfiado. Apenas enfiado. E do mesmo modo que o grão que trazia
na asa não era muito grande nem muito pequeno. Apenas um grão na asa.
E cruzámo-nos na
porta do centro comercial cá do bairro. Eu a sair, ele a entrar com outros
dois. E o sorriso que esbocei para dentro não foi nem grande nem pequeno. Foi
apenas um sorriso. Que o dixote que um deles me atirou relembrou-me outros tempos,
em que era comum porque na moda: “Olha o Bin Laden!”
Fiquei eu cá fora,
a gozar a luz de fim de tarde e a fumar um cigarrito. A luz era bonita, mas nem
demais nem de menos, não tendo eu nenhuma razão especial para a aproveitar que
não fosse estar a li, a vê-la.
Minutos depois
saem os três. Os outros dois decididos a seguirem para onde quer que fossem,
ele indeciso. Nem muito nem pouco. Apenas indeciso o suficiente para hesitar um
nico, talvez à espera que o tal grão na asa lhe desse o bocadinho de coragem
que lhe faltava. Deu!
Acercando-se e
meio a medo com um pedido de desculpas, disse que eu me parecia com… Karl Marx.
Sorri, claro. Já
tinha ouvido a comparação, mas tão raramente que não pude deixar de sorrir. E
dar-lhe corda. Nem muito nem pouco. Apenas o suficiente para que a timidez dele
se desvanecesse e dissesse o que havia para dizer.
Observei-lhe, para
tal, que a barba dele era mais em redonda e a minha mais para o comprido.
Insistiu e avançou
pelo tema que lhe era caro: as teorias do Marx. Que as tinha lido, em Alemão
(saberia eu que ele era alemão?) e que o Engels lhe tinha seguido as ideias,
ainda que de outra forma.
E ali ficámos um
pedaço à conversa. Não era nem tarde nem cedo, a tarde estava bonita e eu pouco
mais tinha que fazer. A conversa, essa, era deveras interessante. Ver aquele
homem, com menos de trinta anos, com um grão na asa, a discorrer sobre
comunismo, socialismo, social-democracia, anarquia, a saber quem foram os
grandes pensadores e fazedores a nível mundial…
Nada que se
esperasse daquela figura, mais desempregado que com trabalho, com roupas
modestas mas uma mente riquíssima, meio feita de ideias feitas, meio feita de
ideias próprias, tratando por tu alguns nomes grandes do pensamento político e
social…
Creio que para ele
aquele é o seu refugio, considerando a sua condição material. E que aquele
momento foi grande para ele, que a sua sede de falar com alguém que lhe
respondia quase ao nível lhe agradou em particular.
Separámo-nos com
um sorriso e um forte e franco aperto de mão. Dos amigos, um desaparecera,
talvez que sem paciência para tais conversas. O outro ficara, talvez que com
alguma obrigação de o acompanhar para onde quer que ele tinha que ir.
Mas com toda a
certeza que não serão alguns grãos na asa nem as dificuldades materiais que lhe
tolherão o passo.
Quando as mentes
são capazes de ultrapassar essas ou outras dificuldades, o sorriso é
permanente.
Tal como o dono
desta mão, que conheço também aqui do bairro, e que nunca vi sem ser com um
sorriso franco estampado na cara.
O meu bairro não é
nem grande nem pequeno, mais para a classe média baixa e baixa que outra coisa,
pouco mais sendo que um bairro dormitório da grande cidade.
Mas na sua gente,
caramba, é tão rico como qualquer outro. Nem mais nem menos!
By me
Subscrever:
Mensagens (Atom)