Embrulhámo-nos em
nacionalismos!
Frementes de ardor
e plenos de esperança, as cores nacionais decoraram janelas, subiram mastros,
encheram almas e cobriram corpos.
Pela vitória de
uma equipa de futebol. Pelo confronto de uns quantos de portugueses com outros
tantos de outras nações.
Em cima do
verde-relva, a bola-prateada fez bombear o sangue-vermelho dos portugueses. Até
à frustração final.
Agora as cores são
as mesmas mas, mas o confronto é entre nós e nós mesmos. O prateado da água não
é suficiente para equilibrar o vermelho-fogo com o verde-mato.
Na batalha contra
nós próprios, vamos perdendo eliminatórias sobre eliminatórias. Mas se o
campeonato se repete todos os quatro anos, as árvores levam dezenas para
medrar.
Vemos os soldados
da paz a combater numa guerra inglória e incessante. Porque mal equipados,
porque insuficientes, porque as condições são péssimas, porque mal protegidos…
São carros
obsoletos, é a falta de auto-tanques, é a falta de protecção, é a falta de
acessos, é a falta de vigias, é a falta de aceiros, é a falta de meios, é a
falta de água…
Entretanto os
soldados da guerra guerreiam nos quartéis.
Preparados para
fazer jorrar o vermelho-sangue sobre verde-mato, aguardam em exercícios
inofensivos e no remanso dos quartéis que sejam chamados para uma qualquer
intervenção bélica.
E, enquanto não o
fazem, são enviados para fora, em acções de manutenção de paz, criando créditos
para o país pela nossa solidariedade internacional. Fazendo com que as nossas
cores flamulem nas zonas complicadas. Do estrangeiro.
Enquanto isso, os
veículos verde-pardo dos soldados da guerra ganham pó nos aquartelamentos em
alternativa aos veículos vermelho-vivo dos soldados da paz que ganham pó e
cinza nas serras e planícies.
Investimos em
submarinos e fragatas para guerrear nas águas. Águas que nos fazem falta para
fazer a paz.
Substituiremos as
G3 por novas e mais modernas armas, mas as agulhetas são as mesmas.
Os Puma sairão de
serviço porque novos foram encomendados, mas continuamos sem baldes nos céus.
Terminou o serviço
militar obrigatório.
Agora só vai
aprender a ferir e matar outro ser humano quem o quiser fazer, ainda que a
contra-gosto de muitos outros. Vão-no profissionalmente, sabendo o que os
espera: a vã e inglória tarefa de se treinarem nos quartéis para uma guerra tão
ilusória quanto distante no espaço e no tempo.
E que tal fazer
parte desse ofício o combate da paz?
Investir em
treinos, conhecimentos e equipamentos para que possam também intervir nas lutas
de paz.
Dentro de
fronteiras.
Sem glórias nem
fanfarras, sem tiros nem baionetas. Defendendo o que é nosso e dos vindouros,
investindo domesticamente na existência do ser humano e de todos os outros.
Talvez assim não
pensasse, ao ver um militar (praça, sargento ou oficial):
“Lá vai um que
decidiu fazer do assassinato uma profissão!”
Talvez assim
tivéssemos orgulho nas nossas cores, usadas em paz e pela paz.
E pudéssemos todos
cantar em uníssono: “… contra os incêndios, marchar, marchar!”
Eu mesmo